Sobre outras epidemias que assolaram Salvador

Linha Fina Lorem ipsum dolor sit amet consectetur adipisicing elit. Dolorum ipsa voluptatum enim voluptatem dignissimos.

  • Foto do(a) author(a) Nelson Cadena
  • Nelson Cadena

Publicado em 2 de abril de 2020 às 05:04

- Atualizado há um ano

. Crédito: .

Em 03 de setembro de 1849, as autoridades sanitárias de Salvador, informadas da morte suspeita de dois tripulantes do navio americano “Brazil” - procedente de Nova Orleans, com escala em Havana - e dos sintomas de vários passageiros com  febre e cor amarelada, requereram do capitão a carta de saúde, constataram que estava em dia, documentos em ordem, e liberaram o desembarque. Entre as evidências e a burocracia venceu a burocracia. Era um dia de domingo e a febre amarela, doravante denominada nos relatórios oficiais de “epidemia reinante”, aportava em Salvador para causar milhares de vítimas.

Em outubro, as autoridades sanitárias constatavam três óbitos em terra e no mês seguinte o Dr. Paterson - homenageado com um busto no Largo da Graça - médico do Hospital Inglês, alertou sobre a doença e a sua propagação, o seu caráter epidêmico. As autoridades não lhe deram muita atenção, tanto que permitiram o embarque pelo Porto de Salvador, na barca americana “Navarre”, de vários tripulantes infectados que introduziram a doença no Rio de Janeiro, a partir das noites boemias da Taverna do Frank.

O fato é que, 163 anos depois da primeira epidemia de febre amarela da cidade (1786), as autoridades sanitárias não tinham um plano de ação para uma eventual emergência. O jeito foi improvisar. Inicialmente, os doentes foram transferidos para o Hospital da Caridade da Santa Casa de Misericórdia, que não conseguiu atender a demanda. Várias enfermarias foram montadas para atender a emergência. Uma no Convento de Santa Tereza, onde os seminaristas solicitaram do vice-reitor permissão para assistir os doentes, conforme informou “O Noticiador Católico”.

Outra enfermaria foi improvisada no Convento do Carmo, onde faleceram treze indivíduos e ainda no Hospital Inglês, na clínica do Dr. Fairbanks e na residência do pioneiro da hematologia no Brasil, o Dr. Otto Wucherer, que perdeu quase todos os doentes e a própria esposa e, diante dos reveses, resolveu atender os infectados nas próprias embarcações. Mais tarde, a instâncias da colônia alemã, dispôs de uma enfermaria mais ampla e arejada do que o acanhado espaço de sua casa. 

Como em todas as epidemias foi preconizado um remédio milagroso, o sulfato de Quinina, recomendado pelo Dr. Antônio Policarpo, da Santa Casa da Bahia. Não era uma panaceia e, sim, um alternativo da Cloroquina, a mesma recomendada atualmente para o coronavírus, e pelos relatórios do médico, de fato, o remédio diminuiu o tempo de internação dos doentes infectados. Era tudo que as autoridades sanitárias queriam para liberar leitos. O jornal Acadêmico dos estudantes de Medicina validou as experiências, fez ressalvas e considerou que era bem melhor do que outros tratamentos, sem resultados positivos. 

Estrangeiros eram a maioria dos infectados nesta primeira onda da doença. Os relatórios da Santa Casa da Misericórdia da época nos revelam um contingente de pacientes de mais de vinte países, poucos brasileiros. A maioria dos doentes eram jovens entre 18 e 25 anos, provavelmente marinheiros, poucos com idades acima de 30 anos e o período de internação normalmente não passava de cinco dias. Com a propagação da doença e o colapso do sistema de saúde foram criadas comissões paroquiais cuja função era identificar os doentes da região e o encaminhamento dos mais necessitados para tratamento gratuito nas suas próprias residências. Não deu muito certo pois veio uma segunda onda e logo mais outra epidemia, a de Cólera Morbus. Duas calamidades para atormentar os baianos.