Tá todo mundo com covid? Contaminação dispara nos primeiros dias de 2022

Titular da SMS fala em 'descontrole epidemiológico' na capital

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  • Da Redação

Publicado em 8 de janeiro de 2022 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Paula Fróes/CORREIO

É bastante provável que, nesse momento, o leitor conheça alguém com covid, tenha diagnóstico positivo para a doença, foi infectado e ainda não sabe ou esteja sob altíssimo risco de contraí-la. Antes que a afirmativa seja tratada como exagero ou excesso de paranoia, ela é mais real do que parece para quem mora em Salvador. A prova definitiva veio na sexta-feira (07), quando o secretário municipal da Saúde, Leo Prates, alertou que o quadro atual da pandemia na cidade é de "descontrole epidemiológico", com o avanço acelerado de uma nova onda nos primeiros dias de 2022.

O panorama apontado pelo secretário se baseia inteiramente em números contabilizados desde o início de janeiro. Sobretudo, o fator RT, usado para medir a taxa de transmissão do vírus. "Estamos com RT de 1,1. É a primeira vez depois de muito tempo que ele passa de 1 em Salvador. Isso significa que a doença está em aceleração", afirmou Leo Prates, cujos pais estão infectados. Quando o índice ultrapassa tal marca, rompe-se a margem de segurança. Trocando em miúdos, cada paciente com coronavírus vai transmiti-lo para mais de uma pessoa. No fim da tarde de sexta, havia atingido 1,2 - recorde de toda a pandemia na capital.

Outros dois dados comprovam a velocidade da nova onda em Salvador, deflagrada após as festas de fim de ano, época em que a população relaxa em relação às medidas de segurança e aos protocolos voltados a conter a pandemia. Um deles é o balanço de testes rápidos realizados pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS). No posto do Bonfim, por exemplo, a cada 217 exames feitos em dezembro, três davam positivo. Na última quarta-feira 05), o número saltou para 30. Já na manhã do dia seguinte, de quatro diagnósticos, um confirmava a doença. A ocupação de leitos pediátricos vai na mesma direção.

Na segunda-feira passada, a ocupação nessas unidades atingiu 100%. "Mas a gente deu uma reforçada na equipe de giro de leitos, para que a criança com condição não demore tanto para ter alta. Nessa época, faz diferença. Aí conseguimos baixar para 85%", disse o chefe da SMS. A perspectiva, no entanto, é de que o quadro piore ainda mais. "A projeção é de uma aceleração da pandemia no final de janeiro em todo o Brasil, principalmente com a Ômicron", emendou. Com isso, cresce o temor de que o número de casos graves e mortes volte a subir.

"A gente pode enfrentar um nível de agravamentos e óbitos que nunca tivemos, porque nosso buraco de vacinação jamais esteve tão grande. É um fator preocupante. A doença em aceleração pode ser um problema gerado pela população. Atualmente, 411 mil pessoas não foram receber a terceira dose, e mais de 200 mil ainda não tomaram a segunda", explicou o secretário. Para dimensionar a importância da imunização, 80% dos leitos hospitalares destinados para pacientes da covid na rede municipal estão ocupados por pessoas não vacinadas ou com ciclo em atraso.       

Avanço simultâneo

O galope da covid vai além de Salvador. Em toda a Bahia, a tendência também se repete. Ao comparar os casos registrados nos seis primeiros dias do ano com o mesmo período de dezembro de 2021, o incremento é de 14,6%. Em relação a novembro, o acréscimo é de 37,40%. De 1º a 6 de janeiro, foram contabilizados 3.097 novos pacientes infectados. Na sexta, somaram-se mais 1.334, o maior número desde 12 de agosto de 2021, quando foram notificados 1.362 casos da doença em 24 horas, segundo balanço da Secretaria de Saúde do Estado (Sesab). No total, a conta de mortes causadas em 2022 pela covid no estado chegou a 68. 

“É necessário fazer a utilização de máscaras, evitar aglomerações, manter o distanciamento físico e a higienização das mãos, além do esquema vacinal. É preciso que a população leve a sério essas recomendações”, alertou a chefe da Sesab, Tereza Paim, ao pedir que a população retome ou continue a adotar cuidados essenciais já conhecidos pela imensa maioria das pessoas. A desatenção quanto a medidas de controle da doença durante o Réveillon é tida como causa mais provável para o salto exponencial do vírus.

Mesmo que o coronavírus não tenha atingido o círculo familiar e social de alguns durante as festas de fim de ano, ele infectou simultaneamente uma quantidade jamais vista de artistas e celebridades. Para citar somente os baianos, a lista inclui a influencer Gabriela Pugliese e os cantores Xanddy, Márcio Victor, Margareth Menezes, Tuca Fernandes, Preta Gil, Durval Lélys e Saulo Fernandes, que anunciaram na sexta o cancelamento do Pranchão, evento previsto para sábado, na Arena Fonte Nova. Fora do estado, há nomes como o sertanejo Gusttavo Lima, o ex-jogador Ronaldo Fenômeno, a cantora Duda Beat, o sambista Dudu Nobre e dezenas de personalidades famosas.

Para o médico e neurocientista Miguel Nicolelis, um dos principais estudiosos sobre a covid, os registros não dão a dimensão real do que está acontecendo no Brasil. Resultado do apagão de dados do Ministério da Saúde causado pelo ataque hacker ao sistema da pasta, apontou. "A explosão não está nem documentada corretamente. Com o apagão, os casos estão subnotificados há meses no país. Eu diria que já estamos na casa dos 100 mil novos casos por dia", afirmou. De acordo com Nicolelis, a onda é mais perigosa do que se pensa.  

Especialmente, por ser impulsionada pela Ômicron, que tem furado a imunidade de vacinados. “Não tem nada de brando, nada de leve nessa onda. Com a variante, que passou por muitas mutações genéticas e é mais transmissível, esse pode ser o golpe de misericórdia no sistema de saúde brasileiro, já bastante combalido”, destacou. Como se fosse pouco, Nicolelis acha que evitar aglomerações pode não ser suficiente para impedir a trajetória ascendente e sem controle do vírus.

*Com a orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro