Turismo: aluguel de imóveis por temporada é opção mais em conta para Carnaval

Aumento da procura já é sentido desde de novembro, que, na comparação com setembro, registrou alta de 188%

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  • Da Redação

Publicado em 9 de janeiro de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

É alto verão na Bahia e ainda falta mais de um mês para o Carnaval, mas a casa da corretora de imóveis Daniela Oliveira, na Barra, já está cheia. Os hóspedes da vez vieram de Aracaju (SE) e Recife (PE) para passar o Réveillon e continuam por lá. A expectativa da corretora, que oferece 13 vagas na própria casa para quem queira pagar R$ 200 por dia em Salvador, é o Carnaval.

As hospedagens não convencionais caíram no gosto dos turistas. O professor de matemática carioca Gabriel Ritter, 33 anos, por exemplo, não quer mais saber de hotel. Desde o ano passado, quando encontrou um apartamento perto das ‘Gordinhas de Ondina’, ele e um grupo de amigos já sabem onde vão passar o Carnaval de 2020 e 2021.

Para quem lucra nessa época do ano, a exemplo de Daniela, os números já são animadores. Dados de uma pesquisa realizada pelo site Imovelweb, um dos maiores portais imobiliários do país, apontam que, em novembro passado, a procura por imóveis de temporada em Salvador já tinha crescido 188% em relação ao mês de setembro. 

Neste verão, Salvador deve receber 3,6 milhões de visitantes, de acordo com a Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (Secult), mas é no Carnaval o pico das locações de imóveis.“Quanto mais perto do Carnaval, melhor. Os melhores meses são fevereiro e janeiro, seguidos de dezembro e março”, conta o arquiteto Éder Villarpando, 31, que aluga um quarto em casa e tem uma empresa, a My Home Bnb (@myhomebnb), para gerenciar o aluguel de outros imóveis.Enquanto a ocupação dos hotéis permanece na média dos 95% entre o Réveillon e o Carnaval, o titular da Secult, Claudio Tinoco, aponta que o que aumenta mesmo é a procura por imóveis para alugar durante a folia. De acordo com ele, o público muda de um evento para o outro, o que também impacta na procura por uma hospedagem.

“Na virada, o público é composto por famílias. Já no Carnaval são grupos de jovens solteiros em virtude de vir para uma festa que tem a característica de rua, bloco e diversão. Neste caso, é muito comum encontrar essas hospedagens de grandes grupos em imóveis pequenos”, diz.

Desde o ano passado, segundo dados da Secult, a maioria dos que vieram para o Carnaval se hospedaram em casas ou apartamentos alugados - 32,5%. Entre os estrangeiros, a modalidade ficou em terceiro lugar - 14,1%.

Camarote e descanso Quem passa pela Barra, Ondina e Avenida Sete perto do Carnaval consegue ver placas de aluga-se por temporada nas fachadas dos prédios. Nesses locais, os apartamentos até viram uma espécie de camarote privado. Também é nas ruas onde passam os trios e arredores que a maior parte dos foliões quer ficar.

A corretora de imóveis Daniela Oliveira aluga a própria casa e a casa de vizinhos na Rua João Pondé, na Barra, do ladinho da festa. Ela reconhece que o Carnaval é o forte e até uma mudança na folia pode impactar as locações.“Quando Ivete ficou sem tocar no trio, eu perdi 50% dos clientes porque meu público é majoritariamente gay”, conta.Assim como Daniela, a corretora de imóveis e diretora de eventos do Conselho Regional de Corretores de Imóveis da Bahia (Creci-BA), Consuelo Leal, indica que os turistas têm preferência pelo circuito. “Para qualquer imóvel, a tendência na alta estação é de ter um aumento na procura. Agora existem pacotes específicos para ocasiões como Carnaval, que são de oito dias. Enquanto no Réveillon há uma busca por casas de praia, no Carnaval, o povo quer ficar perto do circuito", explica.

Sendo assim, até vale sair de casa para deixar o imóvel vago no período. É isso que a aposentada Edleusa Borges, 59, faz desde 2006, quando parou de trabalhar. O apartamento fica a 600 metros do final do circuito do Carnaval, em Ondina. A procura é grande e o imóvel já está alugado para 2020.

“Os turistas querem a folia na hora da folia e, na hora do descanso, querem um lugar para descansar. Como a minha casa não fica no circuito, é uma boa opção. No final do percurso, quando os foliões estão cansados, a casa está mais perto, mas não próximo do barulho”, conta.

Há quem saia de casa para liberar o apartamento para os turistas, mas tem gente que divide o imóvel com os inquilinos. Enquanto Edleusa vai para a casa da família na Ilha de Itaparica, Daniela pega um dos dois quartos da casa para ela e a filha - o resto do imóvel fica para quem quiser pagar os R$ 200 diários para curtir Salvador. A corretora de imóveis Daniela Oliveira aluga a própria casa para fazer renda extra (Arisson Marinho/CORREIO) A corretora oferece treze vagas para os hóspedes carnavalescos. Além do quarto da filha, que acomoda cinco pessoas e da sala que cabe mais seis locatários, mais dois amigos dividem o quarto com Daniela. Ela não trabalha com anúncios e apenas aluga por indicação - no boca a boca.

Preços mais altos Com a procura, os preços também aumentam, em especial nas proximidades do percurso. Os preços das diárias ficam até oito vezes mais caros na semana do Carnaval.“Tem apartamento com diária oito vezes mais caras. É um faturamento muito alto, muito mais que no ano”, diz Éder Villarpando.Um studio ofertado pela My Home Bnb, por exemplo, custaria R$ 141 por noite entre os dias 22 a 28 de janeiro. No Carnaval, a diária sobe para R$ 1 mil entre os dias 21 e 27 de fevereiro. O imóvel fica a 10 minutos a pé do Farol da Barra, de onde saem os trios elétricos.

De acordo com Consuelo Leal, é possível achar um apartamento de dois quartos para até seis pessoas no circuito Barra-Ondina por R$ 8 mil. Já Daniela aponta que os aluguéis na Rua João Pondé variam de R$ 6 mil até R$ 11 mil. Entretanto, tudo depende do que o imóvel oferece e de quando o contrato é fechado.

O advogado presidente do Instituto Baiano de Direito Imobiliário (IBDI), Bernardo Romano, explica que a alta é comum. “É difícil falar de abusividade quando se lida com a questão natural de mercado, quem controla isso é a oferta e demanda”, diz. 

Dicas Romano ainda indica fazer uma contratação prévia do imóvel para não ser pego de surpresa e ter que desembolsar mais do que o esperado. Na empresa de Éder, teve gente que já garantiu a locação em agosto.

Para quem não se adiantou, pode ser complicado encontrar um lugar com um bom custo-benefício. A corretora Daniela diz que a “época de procurar já acabou”. De acordo com ela, o ideal é começar a procurar um lugar para os festejos em outubro.

Deixar para fechar a hospedagem na última hora foi um problema para o estudante Breno Bastos, 18. Em uma viagem para o Festival de Inverno de Garanhuns, em Pernambuco, ele acabou tendo que pagar mais caro por um imóvel pior.

“Entrei em um grupo de pessoas que moram na cidade que disponibilizam a casa para essa temporada. Uma pessoa acerta o valor do imóvel para o período e depois divide com as outras pessoas que querem ficar lá. Na correria, falei com a pessoa que estava organizando o aluguel e tive que pegar no lugar do que o que sairia mais em conta”, conta.

Alugar é bom para os dois lados Alugar um imóvel para o Carnaval pode beneficiar tanto os locadores quanto os locatários. Quem escolhe deixar o hotel de lado e alugar uma casa pode pagar mais barato do que em uma acomodação convencional, ainda mais se o viajante for ficar um período de tempo maior no destino.

O estudante Breno Bastos, 18, sempre escolhe ficar em um imóvel alugado durante suas viagens. “Comparo preços entre hostels e Airbnbs antes de escolher qual a melhor opção. Dificilmente me hospedo em hotéis, que costumam ser mais caros”, conta.

Quem viaja em grupos, como as pessoas quem vêm para Salvador no Carnaval, também vê a opção de ficar em um imóvel com bons olhos. O carioca Gabriel Ritter fica em um apartamento com os amigos e consegue dividir o pacote fechado para a folia, o que é interessante, em especial, pelo valor pago nos blocos.“A gente precisaria de uns três quartos de hotel para ficar durante a viagem. No apartamento fica todo mundo junto e sai mais em conta”, diz.Ficar com os amigos em uma casa também é um plus do aluguel por temporada. “Tem como fazer a sua comida na cozinha, tem uma sala, aí parece mais que está a gente está casa.No dia seguinte de ressaca do bloco, tem uma área de lazer”, ressalta Gabriel.

A estrutura de um imóvel alugado ainda permite que os custos sejam mais reduzidos com a possibilidade de utilizar cozinha a comida em casa e lavar as roupas no próprio local que foi locado, aponta Breno.

Os donos de imóveis percebem este movimento de troca do hotel pelos imóveis alugados, ainda mais com a facilidade das plataformas online. A procura se torna uma oportunidade para fazer uma renda extra.

É com o dinheiro que ganha alugando o apartamento da mãe no Canela que a advogada Uiara Leone paga o IPTU do imóvel. Ela cobra cerca de R$ 1.100 pela diária no Carnaval. “Com a locação de uma semana, dá para pagar o imposto e sobrar dinheiro. Vale a pena”, conta.

Já Edleusa Borges queria fazer uma renda extra depois de se aposentar. Então, decidiu botar o apartamento em Ondina para locar. Ela conta que não consegue cobrar o mesmo preço de antes, mas dá para ganhar uma grana para cobrir o que falta do salário de aposentada.“Em média, eu alugo por R$ 8 mil. O 13º salário é menor quando se está aposentada, senti muita diferença no salário”, diz, sobre a motivação para começar a alugar o imóvel para o Carnaval em 2006.Para Daniela Oliveira, o aluguel também é uma oportunidade de conhecer novas pessoas. Os hóspedes viram amigos e ela passa a ser turista em várias cidades do Brasil. “Recebi o convite para ficar 10 dias em Recife. Ainda faço um café da manhã coletivo com os hóspedes, é muito interessante”, comenta. A corretora ainda dá dicas sobre Salvador para quem aluga o seu apartamento.

O Gerente de Comunicação da Booking.com para a América Latina, Luiz Cegato, aponta que o principal desejo do viajante brasileiro que fica em acomodações alternativas é que seu anfitrião o faça sentir em casa (79%), segundo pesquisa da empresa. Para 78% dos viajantes do Brasil, oferecer um ambiente aconchegante é sinônimo de hospitalidade. Além disso, 62% dos turistas do país acreditam que os anfitriões podem dar dicas valiosas que os ajudem a economizar e evitar armadilhas para turistas.

Dicas para aluguel por temporada Ninguém quer passar perrengue durante as férias, por isso é importante se atentar na hora de alugar um imóvel para ficar durante a viagem. É possível evitar problemas agindo com precaução. O advogado imobiliário e presidente do IBDI, Bernardo Romano, e a corretora de imóveis e diretora de eventos do CRECI-BA, Consuelo Leal, dão dicas de como fazer um bom negócio ao escolher este tipo de acomodação.

Documento - Para evitar fraudes, o turista deve pedir o documento de propriedade do imóvel para garantir que ele pertence realmente a quem está fazendo o aluguel.

Condomínio - Antes de bater o martelo, vale checar as convenções do condomínio para analisar se o conjunto habitacional não restringe atividades que o turista quer fazer, como convidar amigos e fazer festas.

Vistoria - É necessário fazer uma vistoria ao entrar imóvel alugado. Quem aluga deve ver se o local está compatível com o que as fotos mostravam. Se possível, fazer o processo com o dono ou um representante. É possível fazer uma ata notarial com um tabelião para apontar as condições do imóvel.

Risco - Com um advogado, é possível fazer uma clausula no contrato de locação que presume que qualquer item não registrado no documento estavam em condições precárias. Assim, é possível evitar ser culpabilizado por um problema já existente, mas que não foi identificado na vistoria.

Vizinhança - É importante observar onde fica o imóvel e se o local não é perigoso ou de difícil acesso. Checar se a região tem uma boa localização e oferece conforto, como padarias e farmácias próximas, também é válido.

Corretor de imóvel - Ao fechar um contrato com um corretor, é importante verificar se tem um registro profissional válido. Com o número do CRECI é possível verificar a situação do profissional junto ao conselho no site da entidade.

Imóvel existente - Se o turista tem um amigo na cidade, é interessante observar se o imóvel realmente existe no endereço apontado para não cair em fraudes.

*Com orientação do chefe de reportagem Jorge Gauthier