Ufba não vai suspender atividades em 2021, garante vice-reitor: ‘não pararemos’

Orçamento da Ufba em 2021 é quase 20% menor do que no ano passado; UFRJ também passa por cortes e admitiu possibilidade de fechar em julho

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  • Daniel Aloísio

Publicado em 13 de maio de 2021 às 07:10

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

A Universidade Federal da Bahia (Ufba) não vai encerrar as atividades em 2021. Isso é, pelo menos, o que garantiu o vice-reitor da instituição, Paulo César Miguez de Oliveira, em entrevista ao CORREIO. “Se alguém parar a universidade, não será a universidade. Será alguém de fora. Nós não pararemos. Essa casa vai manter as portas abertas”, disse.  

A possibilidade de encerrar ou suspender as atividades entrou em questão depois dos cortes feitos pelo governo federal nas instituições federais de ensino. Só na Ufba, a redução é de 18,7% do orçamento de 2020, quando a universidade tinha disponível cerca de R$ 163 milhões. Agora, em 2021, são apenas R$ 132,8 milhões. Esse valor é inferior aos R$ 133,3 milhões do orçamento de 2010, quando a universidade tinha 15 mil alunos a menos, segundo Miguez. 

“Vamos lidar com isso com as armas que temos de melhor: produzir conhecimento no limite das possibilidades, fazendo os semestres com atividade remotas por causa da pandemia, realizando congressos e em modo resistência”, disse. Já a reitoria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) foi mais dura nas declarações e admitiu a possibilidade de fechar em julho, em artigo no jornal O Globo.  

Na universidade fluminense, o orçamento de 2021 será de R$ 299 milhões, menor do que os R$ 306 milhões de 2020. No entanto, segundo a reitoria, desse dinheiro, somente R$ 146,9 milhões foram liberados e, do valor, R$ 65,2 milhões já foram utilizados, restando apenas R$ 81,7 milhões para a instituição. Os outros R$ 152,2 milhões ainda aguardam aprovação do Congresso Nacional, o que não tem data para apreciação. 

Leia mais: Com falta de recursos, UFRJ diz que pode fechar em julho

Já na UFBA, o professor Miguez explicou que, atualmente, a instituição conta com 40% dos R$ 132,8 milhões de orçamento em 2021. O restante está condicionado a essa mesma aprovação legislativa, o que ele avalia como “perverso”. “Ano passado também foi assim. Eles só aprovaram no momento do ano em que não é possível mais fazer edital e os contratos ficam atrasados. Nós precisamos que o orçamento já tenha agora em junho uma aprovação legislativa”, disse. Ainda que isso não aconteça, a ordem dentro da instituição baiana é resistir.  “Se alguém for o responsável por fechar a universidade, não seremos nós. Se alguém está fazendo isso, que assuma a responsabilidade e decrete o encerramento das atividades universitárias. Não seremos nós da comunidade que vamos fazer. Não abriremos mão de manter a casa aberta para denunciar, resistir e lutar. A universidade é um projeto de futuro, não de governo. A universidade transcende governos, é de estado, da sociedade. Nós passaremos. Ela ficará”, afirmou.  Corte no orçamento não é novidade  Previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA), elaborada pelo governo federal, o orçamento da Ufba é a estimativa do quanto a instituição poderá gastar para manter suas atividades funcionando e investir em novos projetos em 2021. Ao longo dos anos, a Ufba tem sofrido com redução nos valores disponíveis. Em 2016, por exemplo, o orçamento foi de R$ 177 milhões.   Paulo Miguez é vice-reitor da Ufba (Foto: Valter Pontes/Secom)  “Esse ataque no orçamento é um projeto de destruição da universidade pública. Não é um acaso. É claro quando observamos a curva dos recursos destinados à educação”, denuncia o vice-reitor. Em 2019, por causa do corte de gastos, a Ufba precisou adotar medidas emergenciais de contenção de gastos. Os aparelhos de ar-condicionado das salas não puderam ser ligados e, durante o recesso administrativos, a instituição funcionou em horário reduzido, por exemplo. Dessa vez, para lidar com os cortes, a Ufba ainda não definiu com clareza o que poderá ser feito.“Nós estamos tomando todas as medidas para garantir que a universidade continue cumprindo suas obrigações. Estamos nos debruçando nos números e contratos para encontrarmos a melhor saída. Infelizmente, não é possível fazer mágica”, lamenta.  Um campo que já está sendo afetado é o da assistência estudantil. Em abril, a instituição alertou que os recursos do Plano Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes) para a UFBA sofreram um corte de R$ 6,5 milhões, cerca de 18% do que a Ufba investiu em assistência estudantil em 2020. A queda foi de R$ 35,6 milhões para R$ 29,1 milhões. Isso fez com que a Pró-reitoria de Ações Afirmativas e Assistência Estudantil (Proae) tomasse as seguintes medidas de contenção de gastos:  

1) redução de R$ 400,00 para R$ 250,00 por mês das bolsas acadêmicas oferecidas pelos editais Permanecer, Sankofa e Projetos Especiais;  

2) limitação a R$ 200,00 por mês, para estudantes que já recebam algum benefício superior a R$ 400,00 mensais, o auxílio-alimentação temporário por conta do fechamento do Restaurante Universitário (RU);  

3) redução de R$ 800,00 para R$ 400,00 do auxílio de apoio à inclusão digital;  

4) manutenção do auxílio-transporte apenas para os estudantes que recebam somente esse benefício; e  

5) suspensão, por tempo indeterminado, da concessão de auxílio financeiro para saúde e aquisição de material didático.  “O corpo discente enfrenta fragilidade socioeconômica. Esse orçamento de assistência no ano passado já era insuficiente para dar conta dos benefícios que são indispensáveis. Fazer esse corte é absolutamente desrespeitoso com as políticas de inclusão que transformaram a Ufba num local representativo. São muitas pessoas que terão dificuldade em continuar a estudar, pois faltam condições mínimas para isso”, lamentou Miguez. Leia mais: Novo orçamento federal obriga Ufba a fazer cortes em assistência estudantil

Estudantes são prejudicados com cortes  Quem já está sofrendo com o drama orçamentário vivido pela Ufba são os estudantes. Laiz Menezes, 21 anos, aluna de jornalismo, teve o auxílio alimentação reduzido pela metade, de R$ 400 para R$ 200. O dinheiro, ela afirma, não é suficiente para pagar suas contas. “Parte desse dinheiro é usado para pagar o aluguel e no final sobra muito pouco”, disse. Para a estudante, o medo é de não conseguir concluir os estudos caso hajam mais cortes no auxílio estudantil.“A gente tem medo de cortar mais, de acabar todo. E corre o risco de isso acontecer mesmo. As atividades podem parar e isso vai ser muito prejudicial”, lamenta.  O estudante de dança Vinicius da Silva Revolti, 29 anos, também teve o seu auxílio alimentação cortado. No seu instituto, o problema já tem afetado a educação dos colegas. “Tivemos cortes de algumas bolsas da Proae, como alimentação pelo fechamento do restaurante universitário, programas de pesquisa e pessoas que não tiveram seus benefícios mantidos”, lembra.  

Para lidar com esse problema, Vinicius faz parte de um grupo de estudantes que estão sendo afetados. Eles já esperam que a redução seja maior nos próximos dias. “Uma das coisas que a gente tava cogitando é realmente começar a tentar vaga de emprego em qualquer lugar. A gente está bem preocupado com essa situação, principalmente com o nosso suporte. Não sabemos como vai acontecer”, disse.  

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Para lidar com esses problemas, a Ufba vai realizar, na próxima terça-feira (18), um ato virtual que será transmitido no canal do YouTube da TV Ufba. O evento visa denunciar aquilo que a própria instituição classifica como "desmonte de políticas públicas e a destruição em curso do sistema educacional brasileiro". .

Confira a nota completa do MEC sobre a redução no orçamento das instituições federais: O Ministério da Educação (MEC) informa que, para encaminhamento da Proposta de Lei Orçamentária Anual referente ao exercício financeiro de 2021, houve situação de redução dos recursos discricionários da pasta para 2021, em relação à LOA 2020, e consequente redução orçamentária dos recursos discricionários da Rede Federal de Ensino Superior, de forma linear, na ordem de 16,5%.    

Durante a tramitação da PLOA 2021, em atenção à necessidade de observância ao Teto dos Gastos, houve novo ajuste pelo Congresso Nacional, bem como posteriores vetos nas dotações.    

Não obstante a situação colocada, O MEC tem não tem medido esforços nas tentativas de recomposição e/ou mitigação das reduções orçamentárias das IFES.   

O Ministério esclarece ainda que, em observância ao Decreto nº 10.686, de 22 de abril de 2021, foram realizados os bloqueios orçamentários, conforme disposto no anexo do referido decreto.   

Para as universidades e institutos federais, o bloqueio foi de 13,8% e reflete exatamente o mesmo percentual aplicado sobre o total de despesas discricionárias, sem emendas discricionárias, sancionado e publicado na Lei nº 14.144, de 22 de abril de 2021 – LOA 2021. Importa lembrar que o bloqueio de dotação orçamentária não se trata de um procedimento novo, tendo sido adotado em anos anteriores, a exemplo de 2019 (Decreto nº 9.741, de 28 de março de 2019, e da Portaria nº 144, de 2 de maio de 2019).   

Com relação aos demais bloqueios deste Ministério, foram realizadas análises estimadas das despesas que possuem execução mais significativa apenas no segundo semestre, a fim de reduzir os impactos da execução dos programas no primeiro semestre.    

O MEC está promovendo ações junto ao Ministério da Economia para que as dotações sejam desbloqueadas e o orçamento seja disponibilizado em sua totalidade para a pasta.   

Ressalte-se que não houve corte no orçamento das unidades por parte do Ministério da Educação. O que ocorreu foi o bloqueio de dotações orçamentárias para atendimento ao Decreto. Na expectativa de uma evolução do cenário fiscal no segundo semestre, essas dotações poderão ser desbloqueadas e executadas.   

Cumpre destacar que as universidades federais gozam de autonomia em três dimensões: didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, garantidos constitucionalmente, sendo que cabe à universidade a gestão e destinação dos créditos, inclusive eventuais alterações orçamentárias, conforme necessidade. A IFES e o Conselho do próprio hospital são responsáveis pela gestão do mesmo. 

* Com orientação da chefe de reportagem Perla RIbeiro.