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Paulo Sales
Publicado em 6 de janeiro de 2020 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
As Quatro Liberdades surgiram em um momento particularmente sombrio da história das civilizações. Conjunto de diretrizes éticas e morais formuladas pelo ex-presidente norte-americano Franklin Delano Roosevelt, elas se tornaram conhecidas em um discurso histórico proferido por ele no Congresso dos Estados Unidos no dia 6 de janeiro de 1941.>
Naquele momento, os rumos da Segunda Guerra Mundial pareciam pender inevitavelmente para uma vitória das forças nazifascistas lideradas pela Alemanha. Os EUA ainda não haviam sido atacados pelo Japão, e portanto não tinham entrado na guerra, nem a União Soviética vencera a Batalha de Stalingrado, fundamental para reequilibrar o conflito que, como se sabe, acabou vencido pelos Aliados.>
De acordo com as diretrizes de Roosevelt, todos os seres humanos deveriam dispor de quatro liberdades fundamentais. São elas: liberdade de expressão, liberdade religiosa, liberdade de viver sem penúria e liberdade de viver sem medo. Essas premissas serviram de base, anos mais tarde, para a elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos, proposta pela ONU.>
Elas representam um importante alicerce moral que pode e deve nos guiar, como uma versão moderna e laica dos Dez Mandamentos. Mesmo quando se sabe que jamais foram cumpridas à risca, inclusive pelos norte-americanos, sempre às voltas com sangrentas incursões imperialistas (cujo exemplo mais recente ocorreu na última sexta, no ataque contra o Irã).>
Nesses quase 80 anos que nos separam do discurso de Roosevelt, o mundo se deparou com algumas das mais perversas atrocidades contra o ser humano, a começar por aquela que já estava em curso em 1941, nos campos de extermínio nazistas. O que só comprova que a busca pelas Quatro Liberdades permanece profundamente atual e premente.>
Hoje, a liberdade de expressão está ameaçada por tentações autoritárias em várias partes do mundo. Assim como a liberdade religiosa, como comprovam as perseguições sistemáticas às religiões de matriz africana no Brasil, manifestações belas e genuínas que vêm sendo solapadas por um fundamentalismo neopentecostal promovido por escroques. Nada tão grave, porém, quanto a miséria e o medo.>
Desigualdade e violência são os males mais devastadores da nossa era, e não há – salvo exceções – um esforço concentrado em mitigá-las. Não existirá liberdade plena enquanto houver injustiça social e, menos ainda, enquanto estados de exceção continuarem sendo algo corriqueiro, sejam eles institucionais ou marginais.>
Portanto, neste primeiro artigo de 2020, que para alguns representa o início de uma nova década, o meu desejo é bem prosaico: um mundo mais livre e uma busca coletiva pelo bem comum. Além, é claro, de muita prudência, estoicismo, lucidez e – por que não? – leveza e bom humor. Sei que esse discurso pode soar ingênuo e inócuo como as Quatro Liberdades pregadas por Roosevelt. Mas é o que temos e com ele vamos em frente.>