Verdades e Conveniências

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  • Horacio Hastenreiter Filho

Publicado em 17 de agosto de 2021 às 05:50

- Atualizado há um ano

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 pós-verdade, uma das marcas mais evidentes do mundo contemporâneo, parece ter o estranho poder de subjugar a realidade à nossa conveniência. Desse modo, nada é absoluto e as interpretações das ações, fatos e conceitos se tornam elásticas o suficiente para que aqueles que a realizam permaneçam na sua zona de conforto.

O início da atual pandemia de coronavírus na China fez da vilanização do país asiático um ato contumaz, sobretudo entre pessoas mais alinhadas ao pensamento reconhecido como de direita. Na relação de críticas direcionadas ao país, a falta de democracia é um dos lugares comuns. A postura antidemocrática seria da natureza dos governos mais à esquerda, nos quais incluem-se Cuba e Venezuela, países que, frequentemente, assumem o papel dos moinhos de vento quixotescos entre os que compartilham essa forma de pensar.  

Ainda que muitos entendam a democracia como a presença de eleições e a possibilidade, ao menos teórica, de alternância de poder, não são raros os regimes autoritários que adotam a máscara democrática como meio de legitimização. A verdade é que qualquer proposta de julgamento justo do caráter democrático de um governo não prescinde de um debate mais profundo sobre o que é, de fato, a democracia. Seriam os EUA, sempre tidos como referência (com exceção do hiato trumpista), um país democrático? Há variedade em um menu com dois pratos, se, não importa o que se pedir, te servirem a mesma refeição com distinta apresentação?

Em que difere a política externa do democrata Obama da política externa dos presidentes republicanos? Em que medida o governo Clinton foi um contraponto às políticas neoliberais dos dois republicanos que o antecederam? Existem realmente decisões políticas relevantes na terra do Tio Sam que escapem da alçada do Estado Profundo? Aqui mesmo, no nosso patropi, será que nos é dada a liberdade de escolher uma política antineoliberal ou estamos fadados a escolher entre o neoliberalismo gourmet e o neoliberalismo marmita requentada com autoritarismo?  

Na ilha castrense, não é possível esquecer as restrições à liberdade de expressão, mas o pacote comunista contempla acesso irrestrito à saúde, educação e moradia, o que nos incita a pensar a democracia de uma forma ampla, além da posição de quem já tem acesso a esses privilégios. A realidade é que, para muitos, é mais fácil e conveniente pensar democracia e liberdade a partir dos queixumes anticomunistas e esquecer-se da falta de liberdade experimentada por alguns compatriotas, apenas por serem ou pertencerem a uma determinada raça, religião ou comunidade. A lamúria da falta de liberdade na China ou em Cuba no Brasil é a de um país incapaz de se enxergar. Sobretudo, se levarmos em conta o precedente da privação da liberdade pelo simples risco de vitória em uma eleição.

Horacio Nelson Hastenreiter Filho é professor associado da Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia