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Larissa Almeida
Publicado em 17 de junho de 2025 às 05:00
Criadas com o objetivo de garantir o escoamento de produtos agrícolas e oferecer para a população hortifrutigranjeiros a menor custo, as Centrais de Abastecimento de Salvador (Ceasas) vivem um período de decadência em relação ao passado. Boxes fechados, pouco movimento e estrutura precária são, hoje, alguns dos problemas encontrados em pelo menos três das cinco unidades existentes na capital baiana. Em uma delas, a situação é tão crítica que gerou interdição recente, afetando o trabalho de 42 permissionários. >
Situada no Engenho Velho de Brotas, a Ceasa do Ogunjá é uma sombra de si mesma: antes mercado referencial em diversidade de mercadoria, hoje um local que tem apenas 52 dos 104 boxes ativos. Cercada de um lado pela Cesta do Povo e do outro lado por um prédio novo de propriedade da Polícia Civil, o equipamento tem amargado as consequências de um lugar parado no tempo. >
No dia 29 de maio, o mercado foi totalmente interditado por problemas estruturais, que incluíam rachaduras no solo e sinalização de risco nos pilares. Diante da decisão, os permissionários ficaram dois dias sem trabalhar e, depois, foram alocados na área externa do espaço até a conclusão das intervenções emergenciais de escoramento e a emissão de um laudo técnico atestando a segurança da estrutura. >
Após a reabertura, no dia 9 de junho, a Ceasa do Ogunjá passou a contar com barreiras de acesso. A reportagem contou pelo menos sete placas com o escrito “Atenção: Área Isolada, Não Ultrapasse”, além de placas de alumínio isolando ao menos quatro diferentes espaços dentro do mercado. Na percepção da comerciante Silvia Ribeiro, o que deveria ser uma melhoria acabou deixando ainda mais transtorno. >
“O maior problema é a visibilidade do mercado, que já não tinha e, com esse problema, ficou ainda mais apagado. O problema estrutural é visível. Hoje, choveu e aqui dentro ficou com várias poças de água. Disseram que iam colocar os toldos e até agora nada. [Me preocupa] que essas estruturas fiquem por mais tempo, porque elas tomam espaço e afastam as pessoas, até mesmo por medo”, desabafa Silvia. >
O permissionário Crisóstomo Pereira, 68 anos, não reclama de pouca clientela, mas reconhece o impacto do fechamento de boxes e do antigo feirão, que funcionava em uma grande área central do mercado. Atualmente, o local gradeado é um espaço morto dentro do equipamento, com estrutura degradada com ferrugens. >
“O feirão está fechado há muitos anos, desde o governo de Jaques Wagner. Ele prometeu fazer uma reforma ali, desativou o feirão, disse que ia colocar um vidro para que o pessoal da Cesta do Povo conseguisse ver o mercado, mas deu nisso aí. Espero que o governo de Jerônimo venha olhar o mercado, como propôs, porque uma reforma seria boa para todo mundo”, reivindica. >
Decadência das Ceasas
Segundo a permissionária Hilza Maria Fernandes, 61 anos, há pelo menos 22 anos a Ceasa do Ogunjá não passa por uma intervenção profunda. “Os toldos estão deteriorados, completamento furados e com rasgos. O sol bate às 13h e, se não colocar lona, queima a mercadoria toda. Já reivindicamos isso há anos. Como se não fosse suficiente, os boxes estão cheio de pingueiras. [...] Estamos esperando uma melhoria, porque tudo isso afastou muito a clientela”, diz. >
De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Econômico da Bahia (SDE-BA), a pasta está discutindo, junto a Casa civil, a Superintendência de Patrimônio da Secretaria de Administração (Saeb) e a Fundação Luís Eduardo Magalhães (Flem), soluções de médio e longo prazo para a requalificação do Mercado do Ogunjá. >
“A expectativa é que, nos próximos meses, a pasta avance com projetos voltados à melhoria da infraestrutura, garantindo um espaço mais moderno para comerciantes e consumidores”, disse a SDE-BA. >
Na Ceasa do Rio Vermelho, a situação é outra. O principal problema ainda são os reflexos da pandemia de Covid-19, que fechou pelo menos metade dos restaurantes que funcionavam no local. Só agora os permissionários falam em retomada, embora ainda haja dificuldades. >
“Pelo fato de ser o mais antigo aqui, eu vendo porque tenho a minha clientela. Os outros também vendem, mas não tem um movimento grande. Estamos tocando o barco, com maior participação do delivery, porque a pandemia abalou todo mundo”, ressalta Edson de Lima, 82 anos, que há mais de 40 anos mantém na Ceasa o Bar e Restaurante do Edinho. >
Para Márcio Roberto de Almeida, presidente da Associação de Permissionário da Ceasa (Aspec), a falta de investimento e má gestão são os fatores que melhor contemplam os problemas enfrentados pelas Ceasas. “Há um afastamento do estado no que diz respeito a investimentos e as pessoas que estão a frente, fazendo a gestão, não tem conhecimento de causa no mercado de Ceasa”, afirma. >
“Hoje, por exemplo, o Rio Vermelho tem um preço estratosférico de aluguel por metro quadrado. Em momento de poucas vendas e baixo faturamento, as pessoas só conseguem manter o estabelecimento funcionando com menores custos de subsistência”, defende Márcio Roberto. >
Na Ceasa do CIA, já nas imediações de Simões Filho, a maior parte dos comerciantes tem uma estrutura para abrigar as mercadorias. Em contrapartida, uma parcela dos trabalhadores precisa se desdobrar para lidar com a falta de cobertura, a insegurança e as más condições sanitárias do espaço concedido para venda, sendo esta uma situação que se arrasta há décadas. >
“Já teve dia de o ladrão roubar aqui e ir para o meio do mato. Já teve tiroteio. É uma situação precária que vivemos. Eu tenho 53 anos, trabalho desde pequeno aqui e posso dizer que sempre foi assim. Já trabalhei na lama, pior do que está aqui atualmente, prejudicando a mercadoria com sol e chuva. Não tem um sombreiro. O que mais vemos são ratos correndo por aqui. É precário demais”, relata um comerciante que preferiu não se identificar. >
A reportagem procurou a Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE-BA), responsável por administrar as Ceasas para confirmar os dados informados pelos permissionários quanto a data de reformas e total de boxes ativos no Mercado do Ogunjá. Não houve retorno para esta demanda até o fechamento desta reportagem. >