Qual é o real motivo das recentes exonerações na Secretaria de Cultura do Estado da Bahia?

Fiz várias perguntas de trabalho, mas o povo só fala da vaidade de Bruno, esse é o fato

Publicado em 20 de abril de 2024 às 08:00

Um dos sintomas de que a pessoa tá ficando velha é começar a ter certas perguntas respondidas de um jeito não oficial. É que você sempre conhece alguém que conhece outro alguém que circula nas intimidades de gente que ocupa posições de poder. Por isso que, quando o secretário de Cultura do estado da Bahia foi nomeado, e eu perguntei ‘quem é esse, gente?’, não faltou gente pra responder.

O nome Bruno Monteiro não me dizia nada, então me explicaram que ele foi assessor de Jacques Wagner. Mais do que isso, amigo íntimo de dendicasa. Também já foi assessor de Paula Lavigne e meio sócio desse negócio que chama 342 Artes que ela fundou e eu até agora não entendi o que é. Evidentemente, trabalhou na campanha de Jerônimo. Ah, bom. Estava justificada a nomeação porque, como sabemos, quem tem padrinho (e madrinha) não morre pagão.

É gaúcho, mas pediu ao vereador Suíca pra ganhar logo o título de cidadão soteropolitano. Quem disse que ele pediu foi o próprio vereador, durante a sessão. Há registro. Ainda não virou baiano, mas também já deu um jeito nisso. A naturalidade tá em processo e logo ele terá ‘DNA’ da Bahia, pra calar a boca de quem acha estranho um gaúcho (nascido e criado por lá) estar responsável por uma pasta tão cheia das subjetividades do nosso povo. Mas isso é xenofobia, saiba. Inclusive, há muitos baianos de alma que nem nasceram aqui. E outra que não precisa nem ser baiano de alma pra entender que a Bahia não é só Carnaval.

O que eu sei é que - dizem - no começo, ele queria era a secretaria de Comunicação. Até porque é jornalista. Mas a cadeira não vagou e, no frigir dos ovos, teve que se contentar com a Cultura mesmo que de cavalo dado não se olha os dentes e ele, todo cultural, certamente conhece esse ditado popular. Além disso, o secretário já fez curso de teatro. Mas, até aí, eu também fiz. Só que observe o diferencial: ele já conviveu com Caetano, então tem essa formação sólida tamarindeirinho nunca me esqueci.

Mesmo ocupando a cadeira de secretário de Cultura do estado da Bahia, Bruno não abandonou o jornalismo. Ou, pelo menos, não abriu mão de exercer um segmento do ‘jornalismo’ (aspeado) contemporâneo que cuida exclusivamente da promoção da imagem pessoal de indivíduos em redes sociais. Na Secult, uma equipe de mais ou menos dez pessoas cuida da Ascom. Normal. Mas ele, pessoalmente, o próprio secretário, tem a sua própria equipe cuidando da própria imagem. Isso, pra mim, é novidade.

Talvez, o secretário também tenha personal stylist e uma costureira de plantão, mas não posso afirmar essa chiqueza. Suspeitei apenas reparando nas camisas personalizadas com a marca do governo, sempre com tecidos africanos ou bordados, negócio papa fina mesmo. Normalmente, com os temas do momento, até quando o tema não tem nada a ver com secretaria dele. Cada mergulho é um clique. Acho tudo meio estranho, mas posso estar desatualizada.

Só que, pra azar dele, muita gente parece estar tão desatualizada quanto eu. Resultado que o pessoal de arte&cultura (que é pra quem ele trabalha, principalmente) critica muito essa pegada blogueira demais. Talvez, também, peguem no pé por motivo de ‘sem noção’, mas não sei. Apenas desconfio pois, certa vez, assisti a um vídeo desse vivente sambando numa roda de mulheres e tive arrepios de identificação histérica. Minha terapia não está em dia, confesso. Por isso que tive vergonha por alguém que nem meu amigo é nem me perguntou nada. Mas, divago.

‘Exatamente, deixa o menino sambar em paz’, você pode estar pensando. Com razão. Deeeixa ele que ele é secretário de Cultura. Deixa ele com o samba dele, as camisas dele e as redes sociais dele. Miudezas. A pessoa foi nomeada pra cuidar da política cultural da Bahia, então vamos parar com a fofoca e falar de coisa séria. Só que, se este texto parece pessoal até aqui, vai continuar parecendo. Lamento, a culpa não é minha. Veja bem.

Trabalhar com gente é uma miséria, a pessoa precisa ter cuidado. Fiz várias perguntas de trabalho, mas o povo só fala da vaidade de Bruno, esse é o fato. Desconfiada da maledicência, pedi exemplos e recebi. Diz que é assim: a Secult tem os técnicos, principalmente nas autarquias, né? Profissionais que sabem criar editais e regulamentações, que têm intimidade com essa burocracia toda. Pois me garantiram que os técnicos criam os documentos, mas os editais não saem como foram produzidos e sim ‘customizados’ pelo secretário, que curte deixar a própria marca nesses processos. Questão de estilo.

Tem quem também critique o fato de ele centralizar tudo no gabinete dele. Esbocei defender (‘então ele é empenhado, interessado!’) e recebi a galinha pulando de um exemplo contundente. Saca a Lei Paulo Gustavo? Pois, 70% dos recursos dessa lei são destinados ao audiovisual. Por óbvio, então, a Secretaria de Audiovisual deveria fazer a coordenação da lei, dentro da Secult, confere? Que é quem entende desse riscado. Porém o secretário achou melhor cuidar desse assunto com a Superintendência de Promoção da Cultura, no gabinete dele mesmo. Aí, realmente, fica complicado defender.

No meio de uma das conversas, lembrei de quando os eventos calendarizados do estado caíram todos. Na época, procurei saber o motivo. Outra fonte lá de dentro me afirmou que o orçamento do Fundo de Cultura de 2023 estava disponível, mas que o secretário achou melhor deixar esses eventos para 2024. Foi um rebucetê, lembro bem. Nem o Festival de Jazz do Capão aconteceu. Público, produtores, artistas... todo mundo chupando dedo. Mas a decisão dele estava tomada, pronto e acabou.

Aí, o TCA pega fogo. O Teatro Castro Alves pega fogo! Importante, né? Mas a gente fica meses sem saber de nada direito. Um monte de informações desencontradas, zero prazos, tudo estranho. Recentemente é que soubemos da promessa de reabertura em 2026, que a água que apagou o fogo estragou muita coisa, que já havia um projeto de reforma e tal. Outra fonte me explicou que as notícias demoraram porque ele não gosta que ninguém, além dele, dê entrevista sobre as coisas da Secult. Que outras pessoas, em cargos de direção, são proibidas de falar.

E não é ‘só apenas isso’! Pessoal jura que tem grito no gabinete. Que é chilique por cima de chilique. Que ele chega a boicotar ações internas que possam trazer protagonismo para outras pessoas em cargos de direção. Finalmente, que essas exonerações recentes (Luciana Mandelli do IPAC e Piti Canella da Funceb) são providências pra ele poder mandar sem contestações. Parece que as duas tinham discordâncias e opiniões, esse ‘pecado mortal’ que mulheres costumam cometer. Sendo assim, o secretário achou por bem se livrar dos ‘problemas’ e acomodar as coisas com gente que já estava na gestão. Arranjos internos, digamos assim.

Então, qual é o real motivo das recentes exonerações na Secretaria de Cultura do Estado da Bahia? Concluiu aí? Fácil, né? Vaidade, falta de terapia, deslumbramento com o poder. Isso é o que vemos. Por trás - e possibilitando tudo isso - o conhecido descaso do PT da Bahia com certas áreas. Tudo fazendo parte da curiosa competência que os acompanha há tantos mandatos: mesmo sendo um partido de esquerda, fazer gente de esquerda debandar. Vigiem, camaradas. É bom vigiar.

Flavia Azevedo é articulista do Correio, editora e mãe de Leo