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Maria Raquel Brito
Publicado em 11 de novembro de 2025 às 06:30
Era o primeiro dia de setembro de 1976 quando o Brasil ganhou um belo presente: o álbum “A Voz, o Violão, a Música de Djavan”, estreia de um jovem cantor alagoano no mundo da música. Quase 50 anos e 24 discos depois, aquele rapaz é um dos maiores nomes da música popular brasileira e segue em reinvenção. >
Os novos capítulos estão logo ali. Um é o álbum “Improviso”, que chegou hoje (11) às plataformas digitais de música e também ganhará versão em vinil. Ao longo de 12 músicas autorais – entre elas “O Vento”, escrita por Djavan e eternizada na voz de Gal Costa em 1987 –, ele canta sobre as diversas facetas do amor. “É difícil falar de amor, mas ao mesmo tempo é livre”, diz o artista, em entrevista ao CORREIO. >
Djavan em "Improviso"
A outra novidade é a turnê “Djavanear 50 anos. Só sucessos”, em celebração aos 50 anos de carreira, que tem início em maio de 2026 e passará por 11 capitais brasileiras. A segunda parada, para a felicidade dos baianos, é bem aqui em Salvador, no dia 26 de maio. >
À reportagem, Djavan fala sobre o processo de criação das canções, a homenagem a Gal Costa e a melodia que escreveu para Michael Jackson e tomou forma em “Improviso”. E se na faixa-título do novo disco ele entoa “eu canto assim pra você não se esquecer de mim”, hoje uma coisa é certa: não há jeito de esquecer a voz, o violão, os cantos e encantos de Djavan.>
Confira a entrevista: >
1. Esse será seu primeiro álbum de músicas inéditas desde D, de 2022. Como foi o processo de criação de "Improviso"? >
O processo é parecido com os anteriores. Quando eu preciso entrar em estúdio, eu me isolo num lugar para compor as canções. E eu comecei a compor essas canções três meses antes de entrar em estúdio. E depois a gente começa e vai dando vazão àquela cronologia que é natural: primeiro grava base, bateria, baixo, um piano ou violão ou a guitarra. Depois grava os metais, depois as cordas, se houver, e a voz é a última coisa que eu gravo. Então é exatamente quando eu começo a escrever as letras, porque até então eu fiz só música, harmonia e arranjos. E daí o disco nasce.>
2. São 12 músicas autorais, das quais o público só conhecia O Vento, até então pela voz da gigante Gal Costa. Qual a história dessa canção? E como foi a decisão de registrá-la na sua obra, como uma homenagem a Gal?>
A Gal é minha amiga de tantos anos, era um amor profundo que a gente tinha um pelo outro. Ela sempre me pedia uma canção e eu fazia. A mesma coisa aconteceu com O Vento, ela me pediu uma canção e eu fiz, Ronaldo Bastos e eu. Pela primeira vez, fizemos essa parceria. Escrevemos a letra juntos e eu fiz a canção. Agora, eu nunca tinha gravado essa música. Eu quis fazer uma homenagem a Gal. E aí trouxe essa música de volta, gravei e achei que ficou bonito, foi uma maravilha>
3. Ninguém fala de amor como Djavan. São 50 anos de carreira e o amor não se esgota na sua obra, sempre se reinventa. Como o senhor continua a reinventar e encontrar novas formas de traduzir o amor, em suas diversas formas, nas suas músicas? >
O amor não se esgota em lugar nenhum, em pessoa nenhuma. O amor é dinâmico e é um sentimento que se transforma a todo momento, não se repete jamais. Tem até uma canção que eu falo isso, que o amor não se repete jamais. É difícil falar de amor, mas ao mesmo tempo é livre. Não é por ser um sentimento tão recorrente no mundo inteiro que o torna difícil de ser abordado. Porque você tem a liberdade de saber que está falando de um sentimento que muda o tempo todo, que nunca é igual. Então você não se repete jamais, é difícil. Mesmo que você queira, você não vai conseguir se repetir. E isso faz com que ele seja um tema sempre novo e instigante.>
4. Um dos exemplos mais notáveis do álbum, ao meu ver, é “Falta Ralar”, em que o eu-lírico é uma menina de 15 anos e o protagonismo vai para o frescor de um romance adolescente. Qual foi a inspiração para essa faixa? Foi um misto de lembranças e de observar os filhos mais novos e os netos, que estão passando por essa fase agora?>
É uma observância da própria adolescência. Não só dos meus netos como do meu filho que tem 18 anos, o Inácio. Mas o adolescente foi um tema que eu adorei abordar. É um tema que é até difícil de falar, porque é um é um universo que eu vivencio, mas não estou nesse sentimento, porque é adolescente e tudo. Mas [é] uma loucura de instigante você escrever sobre o amor nessa faixa etária. E eu acho que consegui chegar nesse assunto com leveza, com graça e é uma música que tem até um certo humor, né?>
5. Sim. Por outro lado, um pouco antes vem Sonhar, a faixa mais crítica do disco, em que o foco é a falta de amor, a dificuldade – e, ao mesmo tempo, a necessidade – de sonhar em meio às guerras atuais. Como foi a composição dessa canção? O senhor a vê de um jeito mais esperançoso, pessimista ou os dois?>
É uma música que fala dos tempos atuais, mas apontando para o futuro. Eu não fiz necessariamente uma música pessimista. Não, é uma música que tem o otimismo, quer dizer, o futuro está aí, a gente tem que buscá-lo, a gente tem que trabalhar para que ele realmente ascenda. Falar da guerra foi inevitável, porque é o que nós estamos vivendo. E como eu estou falando de um sonho, eu sonho para que o mundo melhore, as pessoas sejam mais felizes, entendam que precisam trabalhar para que o futuro seja realmente bom. E é disso que trata a música.>
6. Em Pra Sempre, há ao fundo sussurros de “Michael Jackson”, e a melodia foi feita para ele, certo? Para integrar o álbum Bad, a pedido de Quincy Jones. Como isso aconteceu? >
Essa música que o Quincy me pediu para o Michael quando ele estava gravando o Bad, eu acabei não mandando em tempo hábil, porque não levei muita fé e tudo. E os meus filhos ficaram me pedindo esses anos todos para eu gravar, porque eles achavam que a música merecia sair do livro, digamos assim. Ser gravada. Agora eu achei que devia gravar. Fiz uma letra, porque ela não tinha, porque a ideia do compositor era que eu mandasse a música para o Michael sem a letra, para ele pôr uma letra caso gostasse. Fiz a letra e gravei e amei ter tomado essa decisão.>
7. Se arrependeu alguma vez de não ter mandado a melodia?>
Não cheguei a me arrepender, não, porque eu não sabia o que poderia acontecer com isso. Não contava com o que poderia acontecer. Eu achei que foi até bom, porque agora eu tive a coragem de gravar a música, fazer uma letra, porque é difícil falar do Michael Jackson, sobretudo depois que ele se foi. Embora eu não acredite que ele se foi, e é isso que eu digo na letra. Mas foi muito bom ter deixado e gravado agora.>
8. É muito bonita, e ao mesmo tempo triste, uma descrição que o senhor fez dele há uns anos como um passarinho. >
É, ele era um passarinho. Ele era um ser humano que tinha uma coisa assustada na postura. Agora, você imagine, uma vida como a que ele teve, uma infância como a que ele teve. É óbvio que ele não era uma pessoa igual a você ou igual a mim. Ele era uma pessoa distinta mesmo.>
9. Antes da música “Um Brinde” ser lançada, uma versão sem letra, só com silabados e entonações livres para conduzir a melodia, foi publicada nas suas redes, para que os fãs fizessem suas próprias versões. Como foi ouvir os resultados? Algum ficou na sua mente? >
Eu achei maravilhoso. Maravilhoso. Eu pude ouvir vozes de mulheres, vozes de homens, lindas. E a musicalidade com que trataram essa música, algumas pessoas me deixaram muito animado. O Brasil continua sendo um celeiro de talentos musicais. Eu achei incrível, foi uma iniciativa muito feliz.>
10. De tempos para cá, os vinis estão de volta no gosto dos amantes da música, o que representa, para muita gente, uma forma de valorizar a história da música, a parte palpável dessa experiência musical. Por que foi importante para o senhor que “Improviso” tivesse também uma versão em vinil? >
Porque o vinil é uma modalidade de disco buscada cada vez mais e porque é maravilhosa, eu gosto da sonoridade. Sabe, você ter aquilo para ver as fotos, para ver as informações… É um tempo que passou e que está voltando, porque tem essa necessidade do manuseio de tudo. Eu sou a favor completamente que o vinil volte cada vez mais forte e que as fábricas de vinil se multipliquem no mundo inteiro, para a gente ter esse formato sempre.>
11. Em 2026, o senhor sai em turnê para promover o álbum e celebrar os 50 anos de "A Voz, o Violão, a Música de Djavan". Olhando para trás, o que o Djavan de hoje diria para o de cinco décadas atrás, prestes a lançar o primeiro disco?>
Eu diria para ele: “Djavan, não tenha medo. Vá fundo, trabalhe, lute, busque, porque quem fica parado é poste. Você tem que trabalhar, você tem que ir em busca do que você deseja”. Porque eu acho que é isso para todo mundo, as pessoas têm que buscar os seus objetivos, têm que buscar os seus sonhos com força, com disposição, com alegria, com certeza.>
12. Uma das paradas da turnê será Salvador. Qual a sua relação com a Bahia e como a música e os artistas baianos, como a própria Gal, se fazem presente na sua obra?>
A minha relação com o Salvador é a mais íntima e mais total que você possa imaginar. Eu amo essa cidade. Eu amo a Bahia. Eu amo a cultura baiana e amo os artistas da Bahia. Eu tenho realmente um apego especial por Salvador. Toda vez que eu vou aí, eu me sinto em casa, muito feliz. Eu sei que o soteropolitano gosta da minha música e eu sou sempre muito bem recebido aí. Eu adoro.>
13. O que o público pode esperar da turnê? Como têm sido as preparações? >
Então, “Djavanear 50 anos. Só sucessos” é o que vai ser a turnê: só sucessos, sucesso desde o início, desde o primeiro disco até agora. Eu acho que vai ser um show maravilhoso, eu estou ansioso para que chegue logo, porque a gente está se preparando para esse show há dois meses. Porque é uma produção bem distinta, para estádios, para lugares maiores. Com uma logística nova no nosso caso e eu acho que vai ser incrível.>