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Maysa Polcri
Publicado em 17 de julho de 2025 às 05:00
Uma estimativa da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb) aponta que cerca de 10 mil empregos do setor industrial baiano deverão ser afetados com a tarifa de 50% sobre produtos brasileiros anunciada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A medida foi determinada neste mês e passará a valer em 1º de agosto. De acordo com Carlos Henrique Passos, presidente da Fieb, a taxação inviabiliza negócios e contribuirá para a perda de postos de trabalho no estado. >
Na Bahia, a indústria de celulose, pneus e cacau serão as mais afetadas pelas tarifas elevadas. Na prática, os produtos baianos ficarão mais caros nas prateleiras americanas, já que os importadores deverão arcar com a taxação para comprar o que é produzido no Brasil. Para Carlos Henrique Passos, a indústria nacional deverá buscar novos mercados para realocar a produção - o que levará tempo e dinheiro. >
"Para algumas indústrias, o mercado americano representa 30% da produção. Se, eventualmente, ela não conseguir dar continuidade àquele mercado no curto prazo, e não encontrar o mercado para colocar os produtos, significará uma redução da produção. Em alguns casos, isso pode inviabilizar as indústrias", afirma o presidente da Fieb. >
Uma projeção feita pela Superintendência de Estudos Econômicos da Bahia (SEI) aponta que, com a imposição tarifária norte-americana, o estado deve amargar um prejuízo de aproximadamente 470 milhões de dólares só no primeiro ano da nova medida, o que daria R$ 2,6 bilhões convertidos. As exportações para os Estados Unidos correspondem a 1% do Produto Interno Bruto (PIB) do estado. >
Veja os setores da indústria baiana que mais serão afetados pela taxação de Trump
"Na Bahia, em torno de 10 mil empregos no setor industrial serão afetados se chegarmos ao ponto que as tarifas impedem qualquer tipo de negócio. Imaginar que alguém que compra um produto por R$ 100 passará a comprar por R$ 150, e manterá aquele mercado, é muito difícil", completa Carlos Henrique Passos. Os custos com a nova tarifa, explica o presidente, teriam que ser repassados ao mercado consumidor, o que, em muitos casos, seria inviável economicamente. >
Especialistas ouvidos pela reportagem explicam que a solução da indústria brasileira deverá ser a busca por novos mercados consumidores para absorver a produção nacional. Tarefa que não é tão simples, como explica Arthur Cruz, coordenador de Conjuntura Econômica da SEI. Entre as dificuldades, estão os custos de logística e barreiras não tarifárias. >
"O que determina a viabilidade de redirecionar produtos para outros mercados são os custos logísticos e de competitividade de cada país. Um produto que é competitivo nos Estados Unidos pode não ser em outro país. Existem dificuldades de exportação de produtos brasileiros especialmente para a União Europeia, que possui normas específicas para a entrada de produtos importados", avalia o coordenador da SEI. >
Para Arthur Cruz, os impactos na perda de postos de trabalho deverão ser sentidos de formas diferentes, a depender da produção de cada setor. Grandes empresas deverão ter mais facilidade para gerir crise, enquanto os pequenos e médios produtores enfrentarão os maiores impactos. Um estudo da Superintendência dos Estudos Econômicos aponta que 210 mil pessoas, na Bahia, estão ligadas à produção de itens exportados para os Estados Unidos. >
Atualmente, os Estados Unidos são o terceiro maior comprador dos produtos industrializados do estado, atrás apenas da China e, recentemente, do Canadá. A indústria baiana exportou para os EUA um montante de 440 milhões de dólares só no primeiro semestre deste ano, o equivalente a R$ 2,4 bilhões. >
O economista Edval Landulfo, vice-presidente do Conselho Regional de Economia da Bahia (Corecon), avalia que ainda é cedo para estimar os impactos da nova tarifa sobre o nível de emprego no estado. Segundo ele, há a expectativa de que o mercado interno absorva parte da produção que antes era destinada à exportação para os Estados Unidos. Com isso, é possível que haja uma queda nos preços desses produtos no mercado nacional.>
Edval Landulfo
EconomistaAo anunciar a taxação de produtos brasileiros, Trump justificou a decisão citando "ordens de censuras secretas e injustas para plataformas de mídia social dos EUA" e mencionou o que chamou de "caça às bruxas" contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Para especialistas, a atitude americana representa interferência na política interna brasileira. Na terça-feira (14), o presidente Lula (PT) regulamentou a Lei de Reciprocidade Comercial, que autoriza o governo a suspender concessões comerciais aos países que imponham barreiras unilaterais. >
Para o professor Henrique Oliveira, coordenador da Agência de Internacionalização e Exportação (AIEX) da Universidade Salvador (Unifacs), a ação do presidente norte-americano pode representar o fim de um ciclo hegemônico comercial liderado pelos EUA. "Não é comum que países imponham tarifas a todos os produtos de outro país. Normalmente, o que ocorre são taxações em cima de itens específicos. Os Estados Unidos estão reagindo à diversificação de parceiros econômicos e a perda de sua hegemonia", avalia. >
A tentativa do presidente Donald Trump de, a partir das tarifas, impor sanções aos países que buscam novos parceiros deve ter efeito contrário. Isso porque os governos deverão encontrar novos mercados para escoar a produção local. De acordo com Henrique Oliveira, a taxação abre espaço para que a indústria baiana reconheça a importância de produzir itens com maior valor agregado. >
A Bahia, por exemplo, exporta cacau para que os Estados Unidos produzam chocolate em solo americano. "É uma boa oportunidade para mostrar a importância de produtos de alto valor agregado direcionados ao mercado de luxo, que não sofrem tanto com as tarifas quanto as commodities. Isso porque os itens produzidos em grande escala e que possuem um baixo valor agregado podem ser exportados por mais países", diz. >
"Todo esse tarifaço causa uma turbulência em diversos mercados. Mas ainda é cedo para cravar quais serão os impactos exatos disso", avalia o economista Edval Landulfo. Além do Brasil, países como Malásia, Coreia do Sul e Canadá receberam avisos de tarifas impostas pelos Estados Unidos. >