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Wendel de Novais
Publicado em 28 de janeiro de 2025 às 08:30
Moradores da Travessa Aristides Victor da Silva, no bairro de São Caetano, em Salvador, amanheceram assustados ao encontrar, no meio do lixo, uma cabeça e partes de um corpo de uma pessoa executada na manhã de segunda-feira (28). No fim de semana, no Trobogy, outro bairro da capital, um corpo foi encontrado com a cabeça arrancada. Dois casos que evidenciam uma prática das facções criminosas: decapitar vítimas e descartá-las de maneira desumana em sacos ou área de mata. >
Em Mirantes de Periperi, no meio da guerra entre as facções do Comando Vermelho (CV) e do Bonde do Maluco, uma cabeça humana foi encontrada em uma lata de tinta. Exemplos que, para o coronel reformado e especialista em segurança pública Antônio Jorge Melo, mostram como, mais do que matar, as facções criminosas agem na intenção de promover medo para grupos rivais e moradores das áreas onde estão. >
Para explicar essa ação, Melo lembra que assassinatos violentos, torturas e estupros sempre foram usados como "arma de guerra" em diferentes momentos e lugares do mundo, além de citar que, atualmente, a degola é utilizada, por exemplo, pelo Estado Islâmico no assassinato de reféns. >
“A ‘inspiração’ das facções brasileiras para a predileção pela decapitação e o esquartejamento não viria, portanto, de uma gangue estrangeira específica, mas sim de uma simbologia consolidada pela história. Historicamente, cortar a cabeça do inimigo funciona como símbolo de "triunfo", o esquartejamento seria uma forma de manifestar a submissão total do oponente”, afirma o especialista. >
Luiz Cláudio Lourenço é cientista social e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Crime e Sociedade (Lassos), da Ufba. O professor também entende a ação das facções como uma demonstração de poder. “É um gesto brutal, grotesco e que reincide na história sempre como uma demonstração de força extrema, brutalidade e aniquilação dos inimigos que porventura possam se opor”, analisa. >
Lourenço traz ainda uma perspectiva histórica para explicar o porquê de traficantes adotarem a decapitação, principalmente, contra membros de facções rivais. “A decapitação de inimigos em vários contextos distintos é sempre uma marca expressiva de força e supremacia. Esse fenômeno não é exclusivo de grupos criminosos e até já foi praticado pelas forças do Estado brasileiro”, aponta. >
Um exemplo lembrado pelo professor é a decapitação de Lampião e Maria Bonita, que tiveram as cabeças expostas na escadaria da Prefeitura de Piranhas em Alagoas e depois exibidas em carreatas em Maceió e Salvador, ficando em exposição pública até 1969 no Museu Nina Rodrigues, na capital baiana.>