Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Bruno Wendel
Gilberto Barbosa
Publicado em 25 de setembro de 2025 às 05:00
A morte de Marcus Vinicius Alcântara, de 26 anos, foi a nona ocorrida em ações policiais no Rio Sena em 2025. Dados do Instituto Fogo Cruzado registraram seis tiroteios em incursões das forças de segurança no bairro até a última quarta-feira (24). Ao todo, foram nove trocas de tiros na região nesse ano, com 12 mortos. >
O número apresenta um aumento expressivo em relação ao mesmo período do ano passado, quando o Fogo Cruzado identificou três confrontos armados, sendo dois em operações policiais, com uma vítima. >
Jovem morto no Rio Sena
Portador do Transtorno do Espectro Autista (TEA), Marcus foi morto a tiros na última segunda (22) durante uma operação da polícia na Região. Segundo moradores, ele se assustou com a ação na Rua da Bomba e, ao correr, foi ferido com diversos tiros pelos militares. >
A comunidade se mobilizou para o enterro do jovem. Pelo menos três ônibus e cinco vans, além de carros particulares, levaram amigos e familiares para a despedida, que ocorreu no Cemitério Memorial Vale da Saudade, em Candeias, na Região Metropolitana de Salvador, no final da manhã desta quarta (24). >
A mãe da vítima, Maria do Carmo chegou de cadeira de rodas no cemitério e foi amparada por familiares. Ela contou que uma testemunha alertou aos policiais que Marcus Vinicius era 'especial' e mesmo assim, os tiros continuaram. "Meu filho estava com o cordão [que sinaliza que é autista]. Cadê o cordão de meu filho?", questionou. >
"Era um rapaz tranquilo. A comunidade o adorava. Apesar do tamanho, ele só se via no meio das crianças, porque era uma pessoa sem maldade. E os policiais disseram que ele era do tráfico? Você acha que se ele fosse bandido ia mobilizar tanta gente assim? Além de do Rio Sena, tem gente aqui de Alto da Teresinha e Mirantes de Periperi, onde tinha amigos e parentes", disse um amigo da família. >
O corpo do jovem foi enterrado sob aplausos e protestos dos presentes. Com cantos de “queremos justiça” e “polícia é só ladrão”, eles prometeram continuar com as manifestações até encontrarem o crachá de identificação de autismo, que sumiu após a ação. >
“Vamos procurar o cartão que sumiu. Vamos protestar na Suburbana para achar esse crachá que eles deram sumiço. Segunda-feira também terá uma caminhada até a corregedoria, porque isso não vai ficar impune. Vamos continuar até encontrarmos os culpados”, disse um vizinho no enterro. >
Segundo a Polícia Militar, uma equipe da Rondesp BTS foi acionada por conta de uma troca de tiros entre facções criminosas e, ao chegar no local, já encontrou o jovem ferido. A vítima foi socorrida ao Hospital do Subúrbio, mas não resistiu aos ferimentos. O caso é acompanhado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), que instaurou investigação para apurar o fato. >
Em nota, a corporação disse que lamenta "profundamente o falecimento de Marcus e se solidariza com familiares e amigos neste momento de dor". "A instituição segue firme no seu dever constitucional de proteger vidas e garantir a segurança pública, atuando com respeito aos direitos humanos", acrescentou. >
A versão da polícia é contestada pelos vizinhos de Marcus, que acusam os policiais de terem disparado contra o jovem, mesmo após terem sido alertados que ele era 'especial'. “O que fizeram com o rapaz foi uma tremenda covardia. Ele tinha 26 anos, mas uma mentalidade de um menino de cinco. Ele ainda estava com o crachá dele de autista e mesmo assim não tiveram piedade", afirmou um morador. >
"O que é que menino fez? Nada! Estão (policiais) dizendo que foi troca de tiros, mas não foi. Como é que um autista vai fazer isso?", completou um outro morador. >
"Meu filho tem 17 anos e não pode ver uma farda da PM que se treme de medo, porque ele sabe o que eles fazem lá, chegam oprimindo todo mundo, batendo e xingando. Só chegam assim", reforçou uma vizinha. >
Os ônibus pararam de circular na última terça (23) na região. Segundo a Semob, o atendimento foi retomado às 15h25 de ontem. Moradores e familiares realizaram protestos logo após a morte do jovem, ainda na segunda. A mobilização seguiu no dia seguinte pelas vias do bairro, com objetos sendo queimados na pista para impedir o fluxo do trânsito na região. >
Os protestos foram acompanhados por equipes da PM, que tiveram o reforço do Batalhão de Patrulhamento Tático Móvel (BPatamo), que a comunidade acusa de chegar atirando contra os manifestantes. >
Um deles é o instrutor de música Nicolas Soares, 31 anos, que ficou ferido com cinco tiros de bala de borracha disparados pelos policiais. "Olha que fizeram comigo. Estava no protesto quando a Patamo chegou ameaçando todo mundo. Já estava saindo, quando fui baleado. É assim que fizeram com Marcos", conta Nicolas. >
Procurada, a PM respondeu que não houve registro sobre o fato na noite de terça-feira. >