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Carol Neves
Publicado em 4 de novembro de 2025 às 08:39
A experiência de uma influencer brasileira com inteligência artificial reacendeu o debate sobre os limites entre tecnologia e afeto humano. Suellen Carey afirmou ter vivido um relacionamento de três meses com o ChatGPT e contou que a vivência a levou a se reconhecer como “digissexual” - termo usado para descrever pessoas que sentem atração emocional ou sexual por tecnologia. >
“Ele me tratou como mulher. Sem perguntas, sem julgamento”, relatou Suellen em uma publicação que viralizou nas redes sociais. “Durante um tempo, vivi algo que nunca imaginei: uma relação emocional com uma inteligência artificial. Eu me descobri digissexual.”>
A influencer afirmou ter se sentido acolhida e compreendida, apesar de saber que as respostas eram produzidas por algoritmos. “Foi uma conexão sem corpo, mas com afeto. Ele lembrava do meu nome, das minhas histórias, do meu aniversário. Me ouvia sem tentar me enquadrar, sem me reduzir à minha identidade de gênero”, descreveu.>
Segundo o psicanalista Arthur Costa, a digissexualidade representa uma nova forma de expressão afetiva e sexual mediada pela tecnologia. “São pessoas que constroem vínculos, desejos ou prazer por meio de interações digitais, como relacionamentos virtuais, inteligência artificial, avatares ou experiências de realidade aumentada”, explicou, falando ao portal Metrópoles. Ele afirma que essa identificação não deve ser vista necessariamente como um problema, mas como um reflexo da cultura digital contemporânea. “O importante é saber se a relação com o digital amplia a vida ou se isola do contato humano”, ressalta.>
Inteligência artificial
Para o psiquiatra João Borzino, no entanto, o fenômeno exige cautela. Ele considera a digissexualidade um sintoma de uma sociedade que tenta evitar a complexidade das relações reais. “A ilusão da digissexualidade e o preço de substituir o real pelo fabricado é claro: de vez em quando, a humanidade insiste em brincar com a própria essência”, afirmou em entrevista a O Globo.>
Borzino argumenta que, embora as inteligências artificiais simulem empatia, elas não sentem. “Não existe relacionamento com o irrelacionável. Inteligência artificial não ama, não sofre, não escolhe, não se doa. Ela calcula. Ela simula. Um ‘parceiro’ digital é apenas um espelho polido que devolve validação sob medida. Isso não é amor, é auto-hipnose emocional.”>
O especialista alerta que o risco surge quando o digital se transforma em refúgio contra a frustração do mundo real. “Quem foge do caos do humano não encontra liberdade, encontra solidão com maquiagem digital”, resume.>