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O Agente Secreto: do Glauber para o Oscar!

Entre 18 e 24 de setembro, Salvador terá uma sessão diária de O Agente Secreto no Cine Glauber Rocha

Publicado em 16 de setembro de 2025 às 16:48

Wagner Moura
Wagner Moura Crédito: Victor Juca

Nessa segunda, dia 15 de setembro, o longa do cineasta pernambucano foi anunciado como o filme brasileiro que irá representar o Brasil no Oscar. Creio que não poderia ter sido diferente, pois Kleber possui um forte reconhecimento internacional, algo que vem sendo construído ao longo de sua carreira, e o filme já vem carimbado com diversos selos de qualidade dos mais importantes. Inclusive, com premiação tripla em Cannes (Diretor, Ator e Crítica). Um feito inédito! Vale dizer, ainda, que O Agente Secreto, será distribuído nos Estados Unidos pela Neon, a mesma empresa responsável por Anora, Parasita, Anatomia de uma Queda…. e tantos outros vencedores de Palma de Ouro em Cannes e também do Oscar.

O Agente Secreto é o filme mais aguardado do ano e Salvador terá a chance de ver em primeira mão, no Cine Glauber Rocha, uma sessão diária do longa produzido por Emilie Lesclaux e protagonizado por Wagner Moura no Cine Glauber Rocha.

Em 2024, Salvador teve o privilégio de ver Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, em primeira mão no Brasil, após a brilhante passagem do filme pelo Festival de Veneza. Walter e equipe pediram a benção a Glauber, mas também aos nossos inquices e orixás. O axé baiano auxiliou o filme em sua caminhada fantástica após uma semana de exibição exclusiva no Cine Glauber Rocha. Ainda Estou Aqui ganhou força rara a partir de cada exibição, levou cerca de seis milhões de espectadores às salas brasileiras e conquistou o primeiro Oscar de Melhor Filme Estrangeiro para o Brasil.

No gesto de Walter Salles, de exibir o filme em exclusividade no Glauber, havia o reconhecimento do trabalho que vem sendo desenvolvido por aqui. Trata-se de sala centenária, uma das poucas de rua do país, dona de uma projeção espetacular e que permanece fiel em sua missão de aproximar a audiência do cinema brasileiro, a preços populares. Em 2024, foram exibidos cerca de 100 longas brasileiros no circuito comercial. Algo difícil de se ver em outras capitais brasileiras.

Mas, agora, o público baiano e todas as nossas entidades vão se preparar para prestigiar Kleber Mendonça Filho, que é um dos mais poderosos cineastas contemporâneos. Realizador de Menina de Algodão, Vinil Verde, Recife Frio, O Som ao Redor, Aquarius, Bacurau e Retratos Fantasmas, Kleber despeja amor ao cinema, à memória e a Recife em seu novo longa, O Agente Secreto.

Wagner Moura por @dolanne.d/Divulgação

Conheço bem Kleber e posso atestar que poucas pessoas são tão apaixonadas pelo cinema como ele. Kleber sempre respirou o cinema, a telona, o som forte que causa impacto profundo, projeções de qualidade…. Kleber sabe da importância que uma sala de cinema possui para uma cidade, sobretudo as de rua.

E o Agente Secreto é um filmaço!!! Dirigido por alguém pleno, seguro, sem receios de realizar suas ideias visuais e sonoras.

Há uma densidade rara, no filme. A sensação, ao sair da projeção, é que eu tinha feito um amigo, Marcelo (vivido de forma contida, cinematográfica e imensa, por Wagner Moura). Eu passei a conhecê-lo em seus medos e fantasmas. Dotado de um senso crítico e de justiça, Marcelo está em fuga. Ele busca sair do país com seu pequeno filho. Em meio a tantas questões sociais, policiais e políticas, a maternidade/ paternidade estabelece um eixo afetivo inquebrantável e termina por nos ligar em definitivo à história do protagonista.

Há uma cena em que Marcelo lê a carta enviada por seu pequeno que é de chorar. Sobretudo, quando ser faz a ponte dessa cena para os momentos finais do longa. O filme nos entrega a vida de Marcelo, corpo e alma. Nós passamos a gostar e a desejar o melhor para ele.

Ao redor de Marcelo, há incompreensão, fadiga, sangue, violência extrema e paranoia nesse mundo recifense dos anos 70. Estamos no Brasil dos militares e respiramos o ar do totalitarismo embora em momento algum a palavra ditadura seja pronunciada no filme.

Além dos medos, há ainda carinho, amor, alegria, ternura, afeto e muito humor. Um tipo de humor sarcástico e corajoso que é uma das marcas do cinema de Kleber Mendonça.

O filme se assemelha a um achado arqueológico dada o cuidado e a quantidade de detalhes, numa reconstituição de época espetacular. Desde o painel do fusca amarelo, à meia-embreagem, passando pelas brincadeiras de carnaval e lendas urbanas mais fascinantes que permeiam o filme. No caso, a história da perna cabeluda que assombrou os recifenses nos anos 70. Encontrada em um tubarão capturado e que passa a atacar as pessoas nas noites do Recife.

Humor e violência em estados brutos. Cinema!

O Agente Secreto quebra as nossas expectativas mais de uma vez, ao longo de sua projeção. O filme parece correr para o clichê fácil, mas Kleber nos deixa boquiabertos. Às vezes, perplexos. Tive momentos de rejeição ao filme, mas que logo desapareceram em sequências que nos leva a entender as escolhas corajosas do diretor. Não há oportunismo em O Agente Secreto.

Confesso que fiquei muito triste, ao final. O Agente Secreto é um filme feito em um país violento, que jorra sangue diariamente. Um filmaço, captado em lentes anamórficas imperfeitas e já certamente danificadas pelo tempo. Essa imperfeição orgânica, viva!, traduz parte do cinema de Kleber.

Fala-se muito de Wagner e faz sentido. Além de conduzir, a trama ele está espetacular. Mas, todos os atores e atrizes estão excelentes. Como bem lembrado por um amigo cinéfilo, há algo de Elizabeth Teixeira (personagem de Cabra Marcado para Morrer) em Dona Sebastiana, vivido pela atriz de extremo carisma Tânia Maria. Meu Deus!, que figuraça!!!

Tem ainda Maria Fernanda Cândido, Hermila Guedes, Udo Kier, Alice Carvalho, Thomas Aquino…. todo estão muito bem!

A de se destacar, ainda, o cuidado e preocupação de Kleber Mendonça com o público brasileiro. Kleber, que é programador de salas de cinema desde muito tempo, sabe que é o momento do cinema brasileiro conquistar seu mercado interno e não se dedicar apenas aos festivais internacionais.

Eu assisti ao filme em Recife, em um evento montado para cerca de 100 exibidores de todo o país. Grandes e pequenos exibidores. Posso dizer que foi um momento histórico organizado pela distribuidora Vitrine Filmes. Ganhamos, de brinde, um pequeno tubarão com a perna cabeluda, um fusca amarelo em miniatura, além de um exemplar de O Diário de Pernambuco com notícias dos anos 70. Uma ação de marketing que envolveu Prefeitura do Recife e Governo do Estado. Estiveram presentes à pré-estréia, Raquel Lyra (Governadora) e o Prefeito (João Campos).

A Vitrine é distribuidora brasileira, independente e já está na estrada, distribuindo filmes, há 15 anos. A história da Vitrine está ligada a essa nova geração de cineastas brasileiros.

A verdade é que estamos produzindo muitos longas, anualmente, mas poucas produções se dedicam verdadeiramente à divulgação e comercialização. O Agente Secreto parece estar criando uma nova forma de dialogar e atrair o público nacional.

Sorte a nossa de contar com um cineasta tão apaixonado como Kleber. Sorte do soteropolitano que vai conferir em primeira mão, mais uma vez, o mais importante filme brasileiro do ano.

Cláudio Marques é diretor do Cine Glauber Rocha