Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Ana Beatriz Sousa
Publicado em 13 de outubro de 2025 às 16:34
Em setembro de 2024, um episódio inusitado chamou a atenção das autoridades chilenas e do mundo. Uma carga contendo 30 pernas humanas chegou ao aeroporto Arturo Merino Benítez, em Santiago, e até hoje permanece congelada no local, presa em um limbo jurídico que ainda não tem solução definitiva.>
As amostras anatômicas vieram dos Estados Unidos e pertencem ao Centro de Entrenamiento Médico Quirúrgico (CEMQ) - uma instituição que realiza treinamentos e capacitação de profissionais da saúde. O objetivo da importação era utilizar os membros em aulas e estudos cirúrgicos, uma prática comum em centros de pesquisa e universidades médicas.>
No entanto, o plano foi interrompido pela legislação chilena, que proíbe a comercialização de partes humanas. Pela lei, apenas restos mortais doados podem ser usados para ensino e pesquisa, o que colocou a remessa em uma zona cinzenta da legislação.>
Desde que a carga chegou ao país, o CEMQ tenta obter autorização para liberar o material. Em setembro de 2025, ao completar um ano retida no aeroporto, a instituição entrou com um novo recurso, alegando que o material passou por controle sanitário rigoroso nos Estados Unidos e que a utilização teria finalidade científica e educacional.>
Apesar disso, a Suprema Corte do Chile rejeitou o pedido. A justificativa é que, mesmo com o consentimento dos falecidos e de seus familiares, não há regulamentação que permita a importação e comercialização de partes humanas no país. Assim, o caso permanece sem solução definitiva, enquanto a carga segue armazenada em câmaras frias do aeroporto.>
A situação reacendeu o debate sobre a escassez de corpos e partes humanas para fins acadêmicos. De acordo com veículos de imprensa locais, diversas faculdades de medicina chilenas relatam dificuldades para obter material humano e recorrem a modelos artificiais e simuladores virtuais.>
Mesmo diante da necessidade, o governo mantém a posição de que não há base legal para permitir a entrada do lote.>
O futuro da carga ainda é incerto. Entre as possibilidades, estão a destruição do material, caso seja considerado irregular, ou a devolução às empresas e famílias envolvidas, para sepultamento ou cremação dos restos mortais.>
Aeroporto internacional de Santiago, no Chile
Enquanto o impasse persiste, as 30 pernas humanas continuam guardadas no aeroporto de Santiago, simbolizando um dos casos mais curiosos e delicados da história recente do país.>
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) esclarece que, segundo a legislação brasileira, a venda de órgãos, tecidos ou partes do corpo humano é proibida e passível de punição penal e administrativa.>
O transporte de restos mortais, exceto cinzas, deve seguir protocolos rígidos: o traslado precisa ocorrer em urnas funerárias devidamente lacradas, com toda a documentação sanitária disponível às autoridades.>
Assim como no Chile, o uso de partes humanas para ensino e pesquisa só é permitido quando há doação formal e consentida, dentro das normas de ética e biossegurança.>