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Dinheiro: psicólogo diz que feridas da infância definem vida financeira; veja dicas para se curar

Em um mundo onde a lógica financeira sugere que é preciso gastar menos do que se ganha, muitas pessoas, mesmo compreendendo essa máxima, se veem presas em ciclos de endividamento, medo de cobrar ou perda inexplicável de dinheiro extra

  • Foto do(a) author(a) Flavia Azevedo
  • Flavia Azevedo

Publicado em 16 de dezembro de 2025 às 05:00

Dinheiro pode ser resgatado
Relação com dinheiro vem da infância Crédito: Shutterstock

Em um mundo onde a lógica financeira sugere que é preciso gastar menos do que se ganha, muitas pessoas, mesmo compreendendo essa máxima, se veem presas em ciclos de endividamento, medo de cobrar ou perda inexplicável de dinheiro extra. Para Marcos Lacerda - psicólogo, psicanalista e criador e apresentador do canal no YouTube "Nós da Questão" - o problema não está apenas na falta de planilhas ou na economia de pequenos gastos.

Lacerda defende que o buraco na conta financeira é, muitas vezes, o reflexo de um buraco emocional ou de experiências vividas na infância. Por isso, ele propõe que a conversa sobre finanças deve focar em conceitos como "roteiros financeiros" (money scripts) e "lealdades invisíveis".

O que se ouviu sobre dinheiro na infância influencia a vida adulta por Reprodução | Freepik

Roteiros financeiros: as crenças inconscientes sobre dinheiro

O termo money scripts (ou roteiros financeiros) foi cunhado pelo psicólogo financeiro e pesquisador Brad Klontz e refere-se a crenças inconscientes que são aprendidas durante a infância. Tais roteiros operam em segundo plano na mente, pois o inconsciente é um modo de funcionamento, não um simples depósito de memórias.

Marcos Lacerda detalha quatro modos principais de operação inconsciente que moldam a relação com o dinheiro:

1. Aversão ao dinheiro

Quem opera neste modo acredita que o dinheiro é algo sujo, mal ou corruptor. Essa lógica pode ser derivada de frases ouvidas na infância, como "dinheiro não traz felicidade" ou "rico não vai para o céu". O adulto que vive este script se sabota inconscientemente, sentindo-se indigno ou mau se começar a ganhar bem. Para evitar esse sentimento negativo, ele encontra formas de perder, não receber, ou doar excessivamente o dinheiro.

2. Adoração ao dinheiro

Neste modo, a pessoa crê que o dinheiro é a "chave mágica" que resolverá todos os seus problemas e trará felicidade, amor ou preenchimento. Existe a crença de que, com muito dinheiro, a tristeza, a solidão e os problemas desaparecerão. O problema central é que o dinheiro nunca é suficiente. Quem adora o dinheiro tende a comprar compulsivamente, tentando preencher um vazio existencial, mas o prazer da compra cessa no momento em que o item é desembalado.

3. Status

Para este perfil, a autoestima está diretamente ligada ao salário ou à conta bancária. A pessoa sente que "é alguém" se tiver um carro do ano ou o telefone da última geração, e se sente um "lixo" se não os tiver. A dor de parecer ou de se sentir menos é insuportável, levando esses indivíduos a se endividarem para manter as aparências associadas a esse status.

4. Vigilância

Pessoas que vivem no modo de vigilância, comparadas por Lacerda ao Tio Patinhas, são constantemente assombradas pelo medo de ficarem pobres. Elas podem até ter dinheiro, mas não o vivem, pois entram em desespero ou surto se o saldo bancário diminuir. Essa ansiedade de escassez as paralisa, e elas não conseguem usufruir de suas compras ou viagens, sofrendo pelo dinheiro que está saindo da conta.

Lealdades invisíveis: o medo de trair o clã

Além dos roteiros financeiros, Marcos Lacerda aponta as lealdades invisíveis como um forte motor da estagnação financeira. Somos "animais de bando" e a exclusão do grupo gera medo.

Se uma pessoa veio de uma família onde houve muita dificuldade financeira, onde o dinheiro era escasso ou motivo constante de brigas, prosperar pode ser sentido como uma traição inconsciente. O indivíduo pode pensar: "Quem sou eu para ter ar condicionado ligado a noite inteira se meu pai trabalhou a vida toda no sol quente?".

Ter dinheiro faz a pessoa se sentir diferente do seu clã de origem, o que dispara o medo de exclusão. Para continuar pertencendo, ela se mantém estagnada financeiramente, em uma forma "torta de amor e lealdade" à sua família.

Outro ponto levantado é o dinheiro como anestésico. Se faltou presença, carinho ou acolhimento na infância, o ato de comprar (o “eu mereço”) torna-se um substituto para a atenção e o amparo não recebidos. O objetivo não é o objeto em si, mas sim comprar "cinco minutos de dopamina para se anestesiar e não sentir o buraco, o vazio que está na alma".

O efeito túnel: como a preocupação afeta a inteligência

Marcos Lacerda também aborda a dimensão cognitiva do endividamento, citando o livro Escassez. A preocupação financeira crônica consome tanta energia mental que o QI funcionalmente cai, um fenômeno chamado "efeito túnel".

Estar endividado torna a pessoa menos inteligente, pois ela perde a capacidade de pensar a longo prazo e fica presa no imediato (o "agora, o agora, a dívida"). Essa incapacidade de raciocinar leva o endividado a tomar decisões financeiras ruins, como buscar agiotas ou pegar empréstimos com juros exorbitantes, perpetuando o ciclo. O estresse crônico do boleto mantém o cérebro em modo sobrevivência, onde não se consegue planejar economia ou aposentadoria.

Os passos para a cura, segundo o psicólogo

Marcos Lacerda afirma que a primeira parte da cura é a consciência do modo em que se opera. Em seguida, é preciso trazer os "fantasmas à luz" através de três passos:

1. O Detetive da Infância: Perguntar-se qual é a primeira lembrança sobre dinheiro: os pais brigavam, sofriam ou o tema era silenciado?. É crucial identificar a "verdade" sobre dinheiro aprendida e questionar se essa forma de ver as finanças ainda é válida ou se faz sentido para a realidade atual.

2. A Carta de Alforria: Para aqueles que sentem culpa por prosperar ou gastar, a proposta é imaginar, mentalmente, uma conversa com os pais. Assumindo o lugar dos pais, a pessoa deve dizer a si mesma: "Nosso esforço foi para que você fosse uma pessoa mais feliz... A sua prosperidade não ofende a nossa memória, na verdade nos orgulha". O objetivo é obter permissão interna para prosperar.

3. O Vazio de Dopamina: Para compradores compulsivos, Lacerda sugere escolher o objeto de desejo online, colocá-lo no carrinho de compras, mas não finalizar a transação por 24 horas. Este vazio permite que a dopamina baixe e o raciocínio volte, permitindo à pessoa perguntar-se: "Eu realmente quero ou preciso desse objeto, ou estou apenas querendo fazer uma compra para transformar algo que estou sentindo dentro de mim?".

Ao se curar internamente, o dinheiro deixa de ser um tirano que escraviza — seja pelo desespero de tê-lo ou de não tê-lo — e assume seu lugar correto: uma ferramenta de liberdade e de amparo ao próximo

Por @flaviaazevedoalmeida