Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Maysa Polcri
Publicado em 1 de julho de 2025 às 05:15
O dia 8 de fevereiro deste ano foi de celebração para 15 aprovados para o cargo de professor auxiliar da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Os candidatos foram aprovados por meio do edital 034/2022 para ocupar vagas em cidades do interior do estado. Porém, quase cinco meses após a divulgação dos nomes no Diário Oficial, os convocados sequer foram encaminhados à junta médica do Estado. Informações internas indicam "overbooking" de vagas, e especialistas alertam para possível omissão da instituição. >
Desde que viu seu nome entre os aprovados para ser professora no curso de Letras, Maria (nome fictício) faz planos que incluem mudança de cidade e matrícula dos filhos em novas escolas. Ela, assim como os outros aprovados, esperava tomar posse do cargo em até 30 dias - prazo que deve ser respeitados pelas instituições públicas. Mas a cada semana, a esperança de assumir a vaga é cada vez mais abalada. >
Pelo menos sete candidatos aprovados no concurso da Uneb ainda não foram encaminhados para realizarem exames médicos, parte essencial antes da posse em cargo público. A situação tem provocado a revolta dos aprovados que, até então, não foram comunicados oficialmente sobre os motivos que travam o prosseguimento da efetivação no cargo. >
"Sou mãe, e o fato de assumir uma vaga em outra cidade exige que eu reorganize a minha vida. Por isso, a incerteza é agustiante", diz uma das aprovadas que prefere não se identificar por medo de represálias da instituição. Ela comenta ainda sobre a situação de colegas na mesma posição. >
"Eu, pelo menos, tenho outro trabalho. Mas têm pessoas que estão há meses sem receber salários enquanto aguardam tomar posse", completa. A remuneração inicial do cargo de professor auxiliar nível A é R$ 3.793,28, podendo ser aumentada pelos docentes que tenham especialização, mestrado ou doutorado. >
Além da aflição enfrentada pelos aprovados, há outro problema. Alunos da Universidade do Estado da Bahia no interior do estado não conseguem se matricular em certas matérias por conta da ausência de professores. É o que acontece, por exemplo, no Departamento de Ciências Humanas e Tecnologias de Seabra. O edital ainda prevê vagas para professores em cidades como Jacobina, Barreiras, Euclides da Cunha e Paulo Afonso. >
Os aprovados no concurso criticam ainda a ausência de diálogo com a universidade, que não fornece informações claras sobre o período para a convocação. "Em todo esse tempo, não existiu sequer uma nota oficial sobre o que está acontecendo. Fomos convocados, mandaram que a gente esperasse e quando perguntamos o porquê da demora, não temos resposta. Sem estabilidade, sem salário e sem dignidade", desabafa outra convocada. >
De maneira não oficial, os convocados foram informados que o número de vagas disponíveis é inferior ao de candidatos aprovados. A razão para isso seria que os professores tomaram posse após decisões judiciais, o que não estava previsto inicialmente nas 134 vagas disponibilizadas. A informação não é confirmada oficialmente pela instituição. >
O 'overbooking' é termo conhecido no setor aéreo e se refere quando uma companhia vende mais passagens do que a aeronave possui assentos disponíveis. Isso acontece quando as empresas vendem mais passagens do que assentos disponíveis, estimando que alguns passageiros não compareçam ao voo. >
A Uneb foi procurada, através da assessoria de imprensa, para responder sobre a demora de quase cinco meses para que os candidatos convocados tomem posse. O questionamento não foi respondido e a reportagem entrou em contato novamente na segunda-feira (30). Dessa vez, a assessoria comunicou que não teria tempo hábil para responder devido à "agenda intensa". O CORREIO também procurou a Secretaria da Administração da Bahia (Saeb), mas não obteve retorno. O espaço segue aberto. >
Em setembro de 2022, o concurso público foi suspenso pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) por suspeita de fraude. Entre as irregularidades apontadas estavam: tempo curto para a finalização do certame, mudanças de regras próxima à data do exame, além de prazo curto entre o sorteio da aula pública e o dia de realização da aula. >
Um acordo judicial firmado entre a Uneb e o Ministério Público da Bahia (MP-BA), em maio de 2023, permitiu a retomada do certame depois que a universidade anulou as provas que continham indícios de fraudes, como rubricas nas folhas de respostas e eliminou candidatos suspeitos de irregularidades. Ao menos 30 candidatos foram convocados no primeiro semestre de 2024.
>
A demora para que os candatos tomem posse como professores após a convocação pode indicar omissão da universidade. É o que explica o advogado e professor Israel Mattozo, especialista em Direito Administrativo e Direito Constitucional. Ele lembra que a posse deve ocorrer em até 30 dias, contatados da data da publicação dos nomes, podendo ser prorrogado por mais 30 dias. >
"Cinco meses de espera após a convocação, sem efetiva posse nem encaminhamento à junta médica, configuram situação de aparente omissão administrativa, cujo ônus não pode ser transferido ao candidato validamente nomeado", diz o advogado, que é sócio da Mattozo e Freitas Advocacia, em Belo Horizonte (MG). >
Israel Mattozo pontua ainda que os candidatos que não tomaram possem podem ingressar com ação na Justiça. "Se a Administração impede ou retarda injustificadamente a submissão do nomeado à inspeção médica ou o seu acesso à posse — como se relata no caso da UNEB —, está violando direito líquido e certo, passível de tutela judicial", completa. >