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Carol Neves
Publicado em 26 de abril de 2025 às 15:06
Durante a cobertura do funeral do papa Francisco neste sábado (26), a jornalista Ilze Scamparini relembrou um dos momentos mais marcantes de sua trajetória profissional: a pergunta feita ao pontífice, em 2013, sobre a posição da Igreja Católica em relação à comunidade LGBT+. A resposta dada pelo papa — “Quem sou eu para julgar?” — marcou o início de um debate interno na Igreja que, segundo a repórter, segue em aberto.>
“Doze anos se passaram. Quando me transporto para aquela cena no avião, ainda sinto um impacto no meu sistema nervoso daquela fala do papa”, afirmou. Ilze destacou que a reação à declaração foi dividida: “Muitos progressistas gostaram dessa fala, mas os ultraconservadores, nem tanto”.>
O episódio ocorreu durante uma viagem papal. Ilze contou que embarcou com uma forte intuição de que deveria fazer aquela pergunta. Ela se posicionou entre os colegas jornalistas e permaneceu com o braço levantado, esperando sua vez. A entrevista, no entanto, foi encerrada pelo porta-voz do Vaticano antes que ela fosse chamada.>
Foi o próprio papa quem percebeu o gesto insistente da repórter e pediu que ela fosse ouvida. “Num gesto, me chamou. Eu fui lá na frente, onde ele estava, e peguei o microfone. Antes de perguntar, pedi licença ao papa para tocar num assunto delicado. Ele consentiu com a cabeça, bem sério”, lembrou. A repórter diz que Francisco ficou visivelmente desconfortável, aparentando certo nervosismo. “Na hora, Francisco ficou bastante embaraçado, um pouco nervoso. Essa foi a minha impressão. Era a primeira vez que alguém perguntava a um papa sobre gays.”>
A resposta do papa foi construída ao longo da reflexão, até culminar na frase que repercutiria mundialmente. “Depois, ele foi fazendo sua reflexão, e então veio a frase, criando um antes e depois, ‘Quem sou eu para julgar?’”, disse Ilze. Para ela, o impacto da declaração foi ainda maior por vir de uma instituição historicamente crítica à questão. “Isso dito por uma igreja que sempre julgou de uma maneira impiedosa.”>
Ao fim da entrevista, Francisco agradeceu a pergunta, mas não sorriu. A repórter contou que sentou-se impactada e fechou os olhos, até sentir o toque do padre Lombardi, então porta-voz do Vaticano. “Ele me disse algo como ‘[fica] tranquila que o papa gostou da pergunta’.”>
Segundo Ilze, o pronunciamento provocou imediata repercussão. “Oito ou nove horas depois, a gente pousou em Ciampino, em Roma. A confusão estava armada e começou então um debate na igreja que até hoje não terminou.”>
Ela destacou ainda que apenas no fim do pontificado Francisco conseguiu abrir espaço para a bênção a casais homoafetivos, sinalizando o peso e a resistência do tema dentro da instituição.>