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William Bonner e a geração sessenta: por que tanta gente está repensando a vida nessa idade?

Eles trocaram o 'fazer o que precisa' por 'fazer o que gosta'. Assim como o jornalista agora ex-JN, brasileiros acima dos 60 anos mostram que recomeçar é possível  e pode ser o período mais pleno da vida

  • Foto do(a) author(a) Moyses Suzart
  • Moyses Suzart

Publicado em 1 de novembro de 2025 às 05:00

William Bonner vai comandar novo programa e Globo Repórter
William Bonner vai comandar Globo Repórter Crédito: Reprodução

Deixar de fazer o que precisa para começar a fazer o que gosta. A afirmação dita por William Bonner ao anunciar a saída do Jornal Nacional, em setembro, foi concretizada na sua despedida do JN na sexta-feira (31), após quase três décadas no posto. Ele, aos 60 anos, resolveu recalcular a rota e vai procurar novos ares numa idade que, para muitos, é o início do fim. Ele vai ganhar menos, mas será feliz elaborando reportagens divertidas e apenas uma vez na semana no Globo Repórter. A mudança tocou uma geração que, assim como Bonner, chegou ou está chegando na fase sessentona e se pergunta sobre os próximos capítulos da vida: insistir na mesmice ou arriscar novos caminhos?

Se você chegou na idade de Bonner e existe aquela minhoquinha na cabeça dizendo que você precisa também procurar seu Globo Repórter, saiba que é mais comum do que imagina. A própria ciência explica e tem um diagnóstico para isso: é a famosa inteligência emocional no seu ápice.

A Universidade de Berkeley fez uma pesquisa sobre habilidades cognitivas em diversas fases da vida humana. Atribuições como raciocínio rápido e lógico ficaram entre os jovens até 25 anos. Beleza. Contudo, o estudo apontou que pessoas com 60 anos alcançam maior domínio sobre suas emoções e passam a perceber com mais facilidade os aspectos positivos das situações da vida. É ou não é a melhor hora de recalcular a rota?

O obstáculo da idade (se é que existe) é o que menos importa na vida de Margarida Macêdo. Aos 66 anos, está no segundo semestre de psicologia na Ucsal. Durante a semana, toda noite, junta seu material didático e vai para faculdade, feliz como se fosse a primeira graduação. E está amando esta nova fase.

“Quando eu fui pro primeiro dia de aula, no curso noturno, tinha uma mulher entrando no mesmo dia que eu, com 44 anos. E ela, quando me viu, se sentiu aliviada, porque estava com vergonha de estar começando uma segunda graduação naquela idade. E eu, aos 66, ali toda felizinha. Aí eu falei: ‘Rapaz, deixa de besteira. Se você não fizer, os cinco anos vão passar. Então é melhor que passem com você fazendo o que gosta’”, lembra Margarida.

Margarida não fala em virada de chave. Para ela, idade nunca foi problema. Criou seus filhos e só depois entrou na primeira graduação, em Letras. Atualmente ensina português para estrangeiros, principalmente japoneses. Margarida acredita que quando um 60+ resolve fazer o que quer é uma ruptura de tudo que a sociedade impõe desde a juventude - obrigada muitas vezes a fazer o que precisa, e não o que gosta.

“Eu nunca achei que idade fosse obstáculo para nada. Porque eu sinto que sou uma pessoa que tenho vida, uma pulsão, vontade de realizar e não vejo algo que me impeça. Quando você começa a se limitar em função da idade, e isso é muito imposto pela sociedade, aquilo que o idoso pode ou não pode fazer, você está aceitando uma imposição”, garante.

‘Cata-velho’

Margarida, inclusive, lembra de um filme brasileiro que fala justamente disso: O Último Azul, lançado este ano. Na trama, o governo brasileiro implanta uma política rígida, em que todos os idosos devem ser transferidos para colônias habitacionais remotas. Eles são ‘coletados’ pelo Cata-Velho, uma espécie de carrocinha que recolhe os idosos na sociedade. “Fiquei muito impressionada. O filme trata justamente dessa questão: os idosos, ao chegar em determinada idade, têm que sair de cena. E é uma mulher que não quer, porque ela tem vida, ela quer seguir em frente. Eu sou isso”. O filme ainda não está disponível nos serviços de streaming.

Futura colega de profissão de Margarida, a coordenadora do curso de Psicologia da Unijorge, Katia Jane, enumera benefícios para quem decide mudar nesta faixa etária. Ela também contempla o fato da ideia de velhice estar mudando ao longo dos tempos. “A forma como enxergamos a velhice mudou radicalmente nas últimas décadas. Se antes envelhecer estava quase sempre associado à ideia de declínio, hoje é cada vez mais compreendido como uma fase plural. Não é mais um ponto final. É uma vírgula”, conta Katia, que incentiva e encoraja quem pretende mudar.

Recomeço pós 60 anos
Margarida Macêdo.: aos 66 anos, está no segundo semestre de psicologia na Ucsal Crédito: Divulgação

“O corpo pode envelhecer, mas a vitalidade, a curiosidade e o desejo de viver continuam pulsando. Recomeços bem-sucedidos trazem satisfação pessoal e fortalecem a autoestima, levando a pessoa a experimentar um renovado senso de propósito, fortalece sua autoestima e mantém a mente ativa. Recomeçar um novo projeto permite que a rede de relações sociais seja ampliada reduzindo sentimentos de isolamento e solidão”, complementa.

Se tem uma pessoa com espírito renovado depois dos 60, este é Enock Santana. Até sua aposentadoria, ele vivia a vida de um trabalhador brasileiro: 100% do dia fazendo o que precisava. Vida sedentária, vivia para o emprego e sustento da família. Chegou a perder um concurso público por conta do TAF. “Não consegui correr dois quilômetros”, lembra. Ficou desempregado um tempo, passou em outro concurso, aquela vida que Bonner provavelmente não sabe como é. Batalhou. Mas, na cabeça deste jovem de 62 anos, a virada tinha uma data: o dia da aposentadoria.

No primeiro dia que completou o período para aposentadoria, deu entrada. Assim que saiu, pediu as contas. Desde então, Enock faz apenas o que gosta. Se antes não conseguia sequer passar num exame de aptidão física, depois dos 60 já fez uma ultramaratona de 135 quilômetros e realizou um sonho antigo: aprender a tocar violão e percussão. Tem até uma banda, com outros aposentados, que toca todo fim de semana em um clube em Stella Maris.

“A idade não é limite. Lamento não ter começado antes, mas ainda assim, depois dos 60, já me tornei ultramaratonista. Eu consegui me aposentar, mas tem colegas da minha idade que não conseguiram e não podem fazer o que faço. Não dá, é complicado. As obrigações tiram isso de nós, o desejo de fazer as coisas que gostamos quando jovens. O jeito é esperar a aposentadoria”, explica.

Além dos desejos reprimidos nas fases anteriores, cuidar da saúde também é crucial para quem quer viver os 60+ bem. Lógico que o corpo não é mais o mesmo, mas, com a devida manutenção na máquina corporal, dá pra ter uma vida atlética como a de Enock. A expectativa de vida, com o avanço da ciência, também ajuda. Só para se ter uma ideia, a média de longevidade do brasileiro em 1940 não passava dos 45 anos. Hoje, chega aos 80. E estamos falando de média. Se há um cuidado com o corpo e a mente, essa expectativa aumenta.

“Chegar aos 60 anos hoje é muito diferente de algumas décadas atrás. Antes era sempre visto como o início do fim, a chegada da velhice, já pensando ali em limitações e dependência. Hoje, principalmente devido ao avanço da medicina preventiva, controle de doenças crônicas, mudança do estilo de vida, acesso a vacinas, as pessoas chegam aos 60 anos com grande vitalidade, vira mais um marco biográfico do que biológico”, explica o médico geriatra e presidente da Sociedade Baiana de Geriatria e Gerontologia, Leonardo Oliva.

Para Oliva, esta mudança na expectativa é crucial, pois a pessoa sabe que a projeção é de, no mínimo, mais 20 anos de vida, ao contrário de nossos antepassados recentes. É bem simples verificar isso com um álbum de família. Pegue as fotografias de familiares que tinham essa idade em tempos atrás e compare com os idosos mais recentes. A mudança é nítida.

“Antigamente não tinha porque se pensar em novos projetos, pois não existia um grande tempo de vida após 60 anos. Hoje, a expectativa de vida média da população ainda é de mais de 20 anos. Isso muda toda a lógica, faz sentido investir novos aprendizados, relacionamentos, trabalho, projetos pessoais, porque ainda se tem muito a viver e conquistar”, incentiva Oliva.

É justamente o que está fazendo Dona Rosa. Aos 65 anos, a técnica de enfermagem Rosângela Sacramento, ou Rosa, decidiu se reinventar e investir na feijoada tradicional que sempre fez nos fins de semana para a família. Com o incentivo da filha Roberta, ela iniciou o empreendimento em 2019 com um carrinho no bairro da Saúde, em Salvador. Hoje, tem o restaurante Casa Di Rosa. Contudo, ainda divide o empreendimento com a profissão na área de saúde. E não reclama da vida dupla.

Recomeço pós 60 anos
Enock Santana: ultramaratonista após os 60 Crédito: Divulgação

“Estou me organizando para me aposentar. Mas, por enquanto, tiro de letra [a vida dupla no restaurante e hospital]. A coisa mais errada do mundo é chegarmos nesta idade achando que não podemos ter desejos, vontade de dançar, ter um negócio, que nada! Não pense que você está velha, isso é loucura! Se espalhe, se expanda, minha filha. Tenha coragem”, resume Rosa.

Outro ponto importante é se programar. Apesar da sua saída da bancada do JN, William Bonner admitiu que já pensava e se programava há anos. Isso é bom, pois planejamento também facilita o processo. E Tânia Borges elevou isso à máxima potência. Não tem barreira, tampouco idade que a limite. Atualmente com 52 anos, ela já projeta os 60 com força máxima. Tânia é médica psiquiatra e especialista em anestesia. Não satisfeita, recentemente, se formou em Direito. E pretende não parar.

Além da Medicina e do Direito, a espiritualidade desempenha um papel central na vida de Tânia. “Sou de formação católica, depois vivi uma experiência como espírita kardecista, e há três anos fui iniciada no Candomblé, vivendo um autoconhecimento profundo”. Esse percurso reflete o desejo de integração de diferentes aspectos da vida, incluindo saúde física e mental, prática profissional e consciência espiritual para ter um 60+ a todo vapor. “Eu quero viver lúcida, quero viver ativa… Espero poder transformar o mundo num lugar melhor”.

Seja na busca por aprendizado, no cuidado com a saúde, no empreendedorismo ou na espiritualidade, a mensagem é clara: nunca é tarde para começar de novo. Afinal, qual será o seu Globo Repórter?

Recomeço pós 60 anos por Divulgação

O futuro é agora!  As dicas para recalcular a rota no pós-60

1. Comece devagar Não precisa revolucionar a vida de uma hora para outra. Experimente novas atividades aos poucos: cursos online, hobbies, voluntariado, um novo esporte ou pequenas viagens. Sair da rotina já é o primeiro passo.

2. Planeje financeiramente Vivemos no capitalismo, né? Mesmo mudanças pequenas exigem algum planejamento. Reveja gastos, organize poupança e avalie possibilidades de renda. Ter segurança financeira dá liberdade para arriscar.

3. Invista na saúde Exercícios físicos e acompanhamento médico são essenciais. Corpo e mente saudáveis aumentam a confiança para encarar novos desafios. Antes de começar um esporte novo, verifique suas particularidades e faça exames de aptidão. Não queira ir logo para uma Olímpiada. O segredo é devagar e sempre.

4. Aprenda algo novo Nunca é tarde para estudar ou desenvolver habilidades. Aprender mantém a mente ativa e abre portas para oportunidades inesperadas. Experimentar uma nova profissão tem sido a principal mudança para quem chega nesta idade. Quem sabe está na hora daquela profissão que sempre foi seu sonho?

5. Busque apoio Converse com amigos, familiares ou profissionais (especialistas, psicólogos, consultores). Ter alguém para orientar ou incentivar ajuda a reduzir o medo da mudança e uma frustração inesperada. Nem tudo vai dar certo, mas não desista de tentar de novo, e de novo, e de novo…

6. Reescreva suas prioridades Aos 60, é hora de colocar você em primeiro lugar. Descubra o que realmente gosta de fazer e comece a priorizar essas atividades. E saiba que cada tempo é precioso. Vá na contramão da pressa e aprenda a contemplar tudo que te faça bem.

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60+