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Carol Neves
Publicado em 8 de outubro de 2025 às 10:59
Uma operação da Polícia Federal revelou um esquema sofisticado de fraudes em concursos públicos que funcionava como uma empresa familiar. Segundo a investigação, a organização cobrava até R$ 500 mil por vaga e utilizava recursos tecnológicos para driblar os sistemas de segurança das bancas examinadoras, incluindo dispositivos eletrônicos implantados cirurgicamente, dublês e comunicação em tempo real durante as provas. >
O grupo operava a partir de Patos, no Sertão da Paraíba, e aceitava pagamentos variados, que iam além do dinheiro, incluindo ouro, veículos e até procedimentos odontológicos. Os valores cobrados variavam conforme o cargo e o nível de dificuldade do concurso.>
Segundo o portal G1, a liderança do esquema era atribuída a Wanderlan Limeira de Sousa, ex-policial militar expulso da corporação em 2021, apontado como o principal articulador. Ele negociava com candidatos, coordenava a logística das provas e distribuía gabaritos. Segundo a PF, o grupo atuava há mais de dez anos, oferecendo aprovações, corrompendo fiscais e utilizando mecanismos de fraude e falsificação para garantir cargos de destaque em órgãos como Polícia Federal, Caixa Econômica, Polícias Civil e Militar, Banco do Brasil, Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e o Concurso Nacional Unificado (CNU).>
Cinco dicas para se preparar para concursos
Wanderlan possui ficha criminal extensa, incluindo homicídio, peculato, concussão, abuso de autoridade e uso de documentos falsos. Após ser expulso da PM, ele chegou a ser aprovado em concursos da Previdência Social e, em 2024, participou do CNU e do concurso do Banco do Brasil. Segundo a PF, sua inscrição no CNU teria servido para demonstrar a eficácia do esquema a potenciais clientes, resultando na aprovação para o cargo de auditor fiscal do trabalho, com salário inicial de R$ 22,9 mil.>
Em diálogos interceptados, Wanderlan orientava seu filho, Wanderson Gabriel Limeira de Souza, responsável pela execução técnica das fraudes: “Você esqueceu que tem o CNU, meu filho. A nossa comissão vai ser lá no CNU. Vou batalhar pra nós, ver se ‘nós consegue’ na ‘poiva’”.>
Filha aprovada servia de "vitrine">
A investigação apontou que familiares de Wanderlan integravam a estrutura: os irmãos Valmir e Antônio, a cunhada Geórgia e a sobrinha Larissa desempenhavam funções específicas. Larissa, também aprovada no CNU, era usada como "vitrine" para atrair novos interessados, reforçando a credibilidade do método quando outros membros da família também obtinham sucesso em concursos.>
Outros integrantes do grupo foram identificados, como Ariosvaldo Lucena de Sousa Júnior, policial militar do Rio Grande do Norte, dono de clínica odontológica suspeita de lavar dinheiro, e Thyago José de Andrade, responsável por controlar pagamentos e repassar informações sobre as fraudes. A PF identificou empréstimos e transações de alto valor ligados ao esquema, incluindo R$ 400 mil emprestados para garantir a aprovação de Larissa.>
Gabaritos iguais eram "coincidência matematicamente improvável">
Entre as evidências, destacam-se gabaritos idênticos no CNU 2024 apresentados por Wanderlan, Valmir, Larissa e Ariosvaldo, inclusive nos erros, indicando improbabilidade de coincidência equivalente a ganhar na Mega-Sena repetidamente 18 ou 19 vezes. A PF aponta o uso de pontos eletrônicos, mensagens codificadas e comunicação externa para transmitir respostas.>
Até o momento da operação, nenhum dos principais investigados havia tomado posse nos concursos. Foram realizadas medidas cautelares, incluindo prisão preventiva, busca e apreensão e afastamento de cargos. O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificou movimentações financeiras incompatíveis com a renda declarada dos suspeitos, incluindo depósitos em espécie e transações imobiliárias fictícias.>
Grupo se envolveu em fraudes desde 2015>
O grupo atuou em dezenas de concursos entre 2015 e 2025, beneficiando pelo menos dez pessoas no CNU 2024 e outros candidatos em certames da Caixa Econômica. Entre os investigados, estão Eduardo Henrique Paredes do Amaral, Allyson Brayner da Silva Lima, Mylanne Beatriz Neves de Queiroz Soares e Laís Giselly Nunes, esta última aprovada no TCE-PE, cujo resultado do concurso foi suspenso.>
A operação, batizada de Última Fase, cumpriu mandados de prisão e busca e apreensão em Patos (PB) e Recife (PE). Até agora, não há indícios de envolvimento direto das bancas organizadoras, mas a investigação cita servidores públicos, profissionais de saúde e intermediários como responsáveis pelo recrutamento de candidatos e movimentação de dinheiro.>
Em nota, Ariosvaldo Lucena de Sousa Júnior nega qualquer envolvimento, e o Ministério da Gestão afirma estar acompanhando as investigações, cumprindo determinações judiciais e adotando medidas de segurança nos concursos subsequentes, como o CNU 2025, incluindo provas codificadas, detectores de metal, detecção de pontos eletrônicos e escolta reforçada pelas polícias federais e estaduais.>