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'Filme de terror': trabalho escravo é flagrado a 200 metros da sede da polícia em Salvador

Empresário aparece em lista do MTE após denúncia de trabalho análogo à escravidão

  • Foto do(a) author(a) Maysa Polcri
  • Maysa Polcri

Publicado em 8 de outubro de 2025 às 05:30

Depósito em Salvador aparece na
Depósito em Salvador aparece na "lista suja" do trabalho escravo do país Crédito: Maysa Polcri/CORREIO

A cerca de 240 metros da sede da Polícia Civil da Bahia, no bairro Dois de Julho, um beco estreito é porta para o trabalho similar à escravidão em Salvador. Um empresário de 63 anos foi incluído na nova "lista suja" do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) por manter trabalhadores em situação degradante. Em maio deste ano, cinco funcionários foram resgatados do local, que segue funcionando normalmente.

Não é difícil encontrar quem saiba do paradeiro de Laurencio Rios dos Santos na rua Direita da Piedade. Conhecido por muitos, o empresário mora no mesmo lugar onde mantém trabalhadores em condições análogas à escravidão, segundo constatado por auditores-fiscais do trabalho, em maio deste ano. O local precário é depósito de carrinhos de camelôs e abrigo para funcionários sem registro formal. 

Cinco meses após o resgate dos trabalhadores, Laurencio Rios aparece na nova lista de empregadores que mantém pessoas em condições degradantes, semelhantes à escravidão. Os nomes de 159 integrantes de todo o país foram divulgados nesta terça-feira (7) pelo Governo Federal. A lista é publicada anualmente e apresenta 12 novos empregadores baianos (veja aqui). Laurencio é o único em atividade em Salvador. 

No dia em que os nomes foram divulgados, a reportagem esteve no local e constatou o que nem os auditores sabiam: o espaço segue funcionando, em condições precárias. Questionado pela reportagem, o empresário negou a acusação, que caracterizou como "fantasiosa". 

Depósito em Salvador aparece na "lista suja" do trabalho escravo do país por Maysa Polcri/CORREIO

O depósito guarda carrinhos que ambulantes utilizam para a venda de água de coco, churrasco, pipoca, bebidas alcoólicas, entre outros itens. Os trabalhadores moram no local e fazem o deslocamento das guias até o ponto dos vendedores. Depois, fazem o recolhimento até o depósito. Recebem, em média, R$ 200 por mês pela função - o equivalente a 13% de um salário mínimo (R$ 1.518). Laurencio recebe dinheiro dos ambulantes por guardar os materiais. 

A edificação é feita com tijolos e estacas de madeiras, e os dormitórios são divididos por tapumes com pouca iluminação. Na auditoria feita em maio, os fiscais identificaram que não existiam banheiros para os trabalhadores, que faziam suas necessidades em um buraco no chão. Ao longo do dia, é constante a entrada e saída de funcionários que carregam equipamentos. 

Inspeção

O auditor fiscal do trabalho Mário Diniz participou da inspeção feita no local em maio. "Trata-se de um local extremamente precário para qualquer tipo de atividade. Constatamos o que chamamos de condições degradantes, em que é estabelecida uma condição de trabalho abaixo do mínimo necessário para a dignidade humana", afirma. 

Foi constatado ainda que os alimentos vendidos pelos ambulantes eram preparados em locais sem higiene, dentro do depósito. "As pessoas dormiam em cima de carrinhos, sem alojamento, comiam qualquer coisa e recebiam uma gratificação pelo trabalho realizado", ressalta Mário Diniz. "Não havia sanitário, mas um buraco onde as pessoas faziam todo tipo de necessidade. Um filme de terror", completa. 

Chama atenção a proximidade do depósito com a sede da Polícia Civil, que fica localizada na Praça da Piedade, a cerca de 240 metros. Manter alguém sob a condição análoga à de escravo é crime previsto no artigo 149 do Código Penal, como reforça a advogada Juliana Costa Pinto, especialista em Direito do Trabalho. 

"A lei prevê pena de 2 a 8 anos e multa, além da pena correspondente à violência, se houver. Além da responsabilização penal, o empregador deve responder na esfera trabalhista, com o pagamento de verbas salariais, indenizações e todas as parcelas trabalhistas não respeitadas no curso do contrato de trabalho, inclusive a rescisão indireta do contrato de trabalho", explica a especialista. 

O outro lado 

Laurencio Rios dos Santos, dono do depósito, nega as acusações. Ele conversou com a reportagem na tarde de terça-feira, dentro do local, onde ele também mora. O homem confirmou que o estabelecimento foi alvo de auditoria do Ministério do Trabalho, mas negou que mantenha os funcionários em condição degradante. 

"O pessoal do Ministério do Trabalho esteve aqui e fez uma operação ridícula, dizendo que aqui tinha trabalho análogo à escravidão. É uma coisa fantasiosa. Eles viram que tudo era livre aqui", afirma o empresário. "Trabalho escravo existe, sim, mas não aqui. Eles [auditores] deveriam ir onde existe", completa Laurencio. 

Distância entre o depósito e a sede da Polícia Civil
Distância entre o depósito e a sede da Polícia Civil Crédito: Reprodução/Google Maps

Entre os trabalhadores que utilizam o depósito como abrigo estão usuários de drogas, pessoas que antes viviam nas ruas e egressos da prisão. "Desde quando o camelô pega uma pessoa e paga para transportar a guia, está dando a condição para aquela pessoa se ressocializar", afirma. 

A inclusão na "lista suja", segundo o MTE, só ocorre após a conclusão de processos administrativos, nos quais "são assegurados aos autuados o contraditório e a ampla defesa". Os nomes permanecem publicados por dois anos. Nesta atualização, além das novas inclusões, foram excluídos 184 empregadores que já haviam completado esse período.

A Polícia Civil foi procurada, mas não localizou registro de denúncia contra Laurencio Rios dos Santos por trabalho análogo à escravidão.

Já o Ministério Público do Trabalho da Bahia informou que não passou informações sobre o andamento do processo contra Laurencio, que diz aguardar ser chamado para assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), caso seja necessário

Veja os nomes dos 12 empregadores baianos incluídos na "lista suja"

Gildo Mota de Almeida Pedreira (Jacobina)

Gilson Luiz Alves de Jesus (Jacobina)

João Eraldo Moreira da Silva (Jacobina)

Laelson Ferreira de Oliveira (Jacobina)

Milton Hartmann (Correntina)

José Simões Amaral (Ibititá)

José Wilson Nunes Moura (Santa Inês)

Laurencio Rios dos Santos (Salvador)

Orlando Emmanuel de Castro Cavalcante Barbosa

Orlando Pessoa Primo (Maiquinique)

André Silva de Souza (Sento Sé)

Ronaldo Batista Ferreira (Barreiras)