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Wladmir Pinheiro
Agência Einstein
Publicado em 30 de dezembro de 2025 às 08:36
Por muito tempo, o tratamento da prisão de ventre foi tratado como algo simples, restrito a orientações como beber mais água e aumentar o consumo de fibras. No entanto, para quem sofre com o intestino preso de forma persistente, a realidade costuma ser mais complexa. A constipação crônica, que pode durar semanas ou até meses, afeta não apenas o funcionamento intestinal, mas também o sono, o humor, a produtividade e a qualidade de vida. Em outubro, a Associação Britânica de Nutricionistas e Dietistas (BDA, na sigla em inglês) publicou uma diretriz inédita sobre o papel da alimentação no enfrentamento desse problema comum.>
Elaborado a partir da análise de 75 ensaios clínicos, revisões sistemáticas e meta-análises, o documento reúne 59 recomendações dietéticas práticas. A proposta é ir além do conselho genérico de “aumente as fibras” e indicar quais alimentos e suplementos realmente apresentam benefícios comprovados, além das doses mais eficazes. >
Kiwi é uma fruta poderosa para ajudar no sono e na recuperação muscular
“Essas diretrizes agrupam intervenções com evidências sólidas e, na prática clínica, auxiliam na condução dos casos trazendo mais especificidade dos principais aliados no combate à constipação crônica”, afirma a nutricionista Gláucia Amaral Santana, coordenadora de Nutrição do Hospital Municipal de Aparecida de Goiânia (HMAP), Iris Rezende Machado, unidade pública gerida pelo Einstein Hospital Israelita em Goiás.>
As novas diretrizes confirmam uma percepção já comum entre nutricionistas: nem todas as fibras atuam da mesma forma no intestino. O principal destaque do documento é o psyllium, fibra extraída da casca da semente da planta Plantago ovata. Ele é considerado o “padrão-ouro” entre os suplementos de fibra quando consumido regularmente em doses de pelo menos 10 gramas por dia.>
“O psyllium é uma fibra solúvel com alto poder de retenção de água. Ele forma um gel no intestino, aumenta o volume das fezes e melhora a consistência, facilitando a evacuação e reduzindo o esforço”, explica Santana. Já outras fibras, como a inulina, apresentaram efeitos mais modestos e maior risco de gases e desconforto abdominal.>
Entre as frutas analisadas, o kiwi se destacou. Segundo a BDA, o consumo de duas unidades por dia, por um período mínimo de quatro semanas, melhora a frequência das evacuações e a textura das fezes. A fruta combina fibras solúveis e enzimas que estimulam o trânsito intestinal, além de fornecer vitamina C e antioxidantes, o que a torna uma alternativa segura e bem tolerada. As diretrizes apontam o kiwi como uma das opções mais eficazes e fáceis de incluir na rotina alimentar.>
“Quando consumido com regularidade, o kiwi apresenta resultados semelhantes ao psyllium, auxiliando na melhora da frequência intestinal. Mas, como toda intervenção nutricional, é importante individualizar, respeitando a rotina, os hábitos e a cultura alimentar de cada pessoa”, pondera a nutricionista.>
O documento também destaca o magnésio como um aliado importante no tratamento da constipação crônica. O mineral está presente em alimentos como verduras de folhas escuras, leguminosas, nozes, grãos integrais, abacate e peixes. Ainda assim, de acordo com a especialista do HMAP, alcançar as doses estudadas apenas por meio da alimentação pode ser difícil, o que leva, em alguns casos, à necessidade de suplementação, sempre com orientação profissional. O óxido de magnésio demonstrou maior eficácia do que o leite de magnésia, e águas minerais com alto teor de magnésio e sulfato também apresentaram bons resultados.>
“Em doses adequadas, o sulfato de magnésio tem efeito osmótico, ou seja, puxa água para dentro do intestino, amolecendo as fezes e facilitando a evacuação”, explica Glaucia Santana. Segundo ela, o efeito está relacionado à composição mineral da água, e não à marca. “É importante observar o rótulo e dar preferência às que têm alto teor de magnésio e sulfato”, orienta.>
A substituição do pão branco pelo pão de centeio também mostrou benefícios. Rico em fibras solúveis e fermentáveis, o cereal contribui para aumentar o volume das fezes e estimular a flora intestinal. No entanto, a especialista ressalta que os estudos analisaram quantidades elevadas, de cerca de seis a oito pães por dia, o que não é viável para a maioria das pessoas.>
“O centeio pode ser um bom aliado, mas o estudo considerou doses muito altas, de cerca de seis a oito pães por dia, o que não é viável para a maioria das pessoas”, observa. “Ele pode fazer parte da alimentação, mas sempre em um plano equilibrado e acompanhado por nutricionista.”>
Por outro lado, frutas tradicionalmente associadas ao alívio do intestino preso, como ameixa e maçã, perderam parte do protagonismo. As diretrizes apontam que, apesar de saudáveis e ricas em fibras, não há evidência científica robusta de que o consumo regular desses alimentos seja eficaz no tratamento da constipação crônica. >
“Esses alimentos continuam sendo boas opções em uma alimentação balanceada, mas não devem ser vistos como solução isolada”, afirma a Santana.>
Por fim, o documento reforça que a saúde intestinal depende também de outros hábitos, como a prática regular de atividade física, sono adequado e a redução do consumo de alimentos ultraprocessados. Em casos de dúvida ou sintomas persistentes, a orientação de um profissional especializado é fundamental.>