Acesse sua conta
Ainda não é assinante?
Ao continuar, você concorda com a nossa Política de Privacidade
ou
Entre com o Google
Alterar senha
Preencha os campos abaixo, e clique em "Confirma alteração" para confirmar a mudança.
Recuperar senha
Preencha o campo abaixo com seu email.

Já tem uma conta? Entre
Alterar senha
Preencha os campos abaixo, e clique em "Confirma alteração" para confirmar a mudança.
Dados não encontrados!
Você ainda não é nosso assinante!
Mas é facil resolver isso, clique abaixo e veja como fazer parte da comunidade Correio *
ASSINE

Saiba quais as facções que dominam os cartões postais de Salvador

Pelo menos três organizações criminosas atuam nos pontos turísticos da capital baiana

  • Foto do(a) author(a) Bruno Wendel
  • Bruno Wendel

Publicado em 18 de agosto de 2025 às 05:00

Marcas do TCP estão em balaustradas na Barra
Marcas do TCP estão em balaustradas na Barra Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

Recentemente, a orla da Barra amanheceu com pichações entre uma balaustrada e uma escadaria. A prática não é novidade, mas o que é assustador é a audácia do Terceiro Comando Puro estampar suas iniciais (TCP) nas imediações do Farol da Barra, um dos cartões postais de Salvador, onde milhares de turistas caminham todos os dias. Mas o farol não é o único cartão postal em que os visitantes dividem o espaço com as organizações criminosas. Porto da Barra, Dique do Tororó, Igreja Bonfim, Humaitá, Lagoa do Abaeté, Elevador Lacerda e o Pelourinho sofrem do mesmo problema.

Para a professora de Direito Penal e Processual e de Movimentos Sociais da Universidade do Estado da Bahia (Uneb), Márcia Margarida Martins, a presença de infraestrutura inadequada em áreas turísticas permite que criminosos se estabeleçam e operem, aumentando a violência. “Podemos afirmar com categórica certeza que a presença de facções como o Comando Vermelho (CV) e o Bonde do Maluco (BDM) em áreas turísticas de Salvador afeta diretamente, concretamente toda a percepção de insegurança: isso pode ser dito com certeza, face as constantes notícias sobre tiroteios, tráfico e violência nessas regiões, que certamente afetam o turismo com o afastamento dos turistas, especialmente estrangeiros, que costumam pesquisar índices de segurança antes de viajar”, declara.

No último dia 5, as iniciais do TCP, uma das maiores organizações criminosas do país, estavam espalhadas na área que fica perto do Barravento, já nas proximidades da Avenida Oceânica. No entanto, nesta terça-feira (12), o CORREIO voltou ao local e encontrou as inscrições estavam cobertas. Mas, segundo quem passa pelo local, a medida não apaga a sensação de insegurança. É preciso mais do que isso. “Não adianta nada pôr tinta aí, se não há um comprometimento em combater de fato o crime organizado aqui ou em qualquer lugar da Bahia. A sensação é de que perdemos essa guerra para eles (criminosos)”, diz o funcionário público João Paulo Feitosa, morador da Barra.

Próximo ao Barravento está o Cristo Nosso Senhor, conhecido como o “Cristo da Barra”. Em frente ao monumento, a comunidade da Roça da Sabina, controlado pelo BDM, o que explicaria as pichações do TCP, pois as duas são parceiras para derrotar a arquirrival CV, presente no Porto da Barra – difícil encontrar um baiano que nunca tenha ido dar um mergulho, seja anônimo ou famoso, na praia mais eclética de Salvador e que já foi considerada uma das melhores do mundo. “O que a gente houve é que por aqui não fica ninguém de ‘três letras’. Se aparecer, é morte na certa. Aqui é ‘tudo dois’”, diz um ambulante, fazendo referência à presença da facção carioca.

Quem assiste ao remake de Vale Tudo (Rede Globo), pode notar que, entre os mais de 150 fremes que mostram a diversidade do país, está a imagem do Diquei do Tororó, com as esculturas de orixás. Porém, o cartão postal exibido na novela durante o horário nobre é outro ponto turístico de Salvador sob o controle do tráfico. As iniciais indicam que ali o território é o do BDM. Isso porque seu entorno é composto por regiões comandadas pela facção, como Engenho Velho de Brotas e o Centro. “Eu me sinto ameaçada”, dispara a autônoma Mari Fortes, após dar de cara, durante a caminhada, com uma das pichações da facção em uma parede de cimento em um dos trechos da lagoa.

É na Península Itapagipana que está um dos pontos obrigatórios de visitação. Seja pelo simbolismo maior da devoção católica, seja pela história, ou pela beleza do local, turistas de toda parte do mundo se encantam com a Igreja do Bonfim. Mas a fé tem que estar em dia, porque a península está dentro da parte da Cidade Baixa dominada pelo BDM. A poucos metros dali, está a Ponta de Humaitá, que é considerada um dos locais mais bonitos da capital baiana, por proporcionar uma das mais belas vistas da Baía de Todos-os-Santos. Lá, a reportagem encontrou um casal de turistas de São Paulo que, apesar das orientações, foi passear no local. “O pessoal do hotel, o motorista por aplicativo, tudo mundo dizendo pra a gente ter cuidado”, declara o autônomo Jorge Pereira, ao lado da namorada, a analista de dados, Gabriela Soleno, que estava abraçada à mochila – a vulnerabilidade dos estrangeiros facilita a exploração de crimes como furtos e assaltos. “Aqui está escondida a minha máquina fotográfica”, diz ela, que sequer arriscou usar o equipamento.

Marcas do TCP estão em balaustradas na Barra por Arisson Marinho/CORREIO

Símbolo da hospitalidade baiana, o Centro Histórico não é mais aquele há anos. A cara dele é de medo. Isso porque virou reduto do BDM. O motivo está na sua aproximação com o Porto de Salvador, por onde parte das drogas e armas chega à organização. Embora o policiamento seja reforçado, principalmente em dias de festa, a “atividade comercial” é feita em regiões anexas, como o bairro da Saúde, que é também território do BDM, além da Rua do Gravatá, a própria Baixa dos Sapateiros, que é vizinha ao Pelourinho.

Imagem de Salvador

Segundo a professora de Direito Penal e Processual e de Movimentos Sociais da Universidade Estado da Bahia (Uneb), Márcia Margarida Martins, além de “uma drástica redução do fluxo turístico, prejudicando a economia local”, o reflexo da presença das organizações criminosas traz ainda o “prejuízo à imagem da cidade no âmbito internacional, pois poderá levar a cidade a ficar associado à violência, afetando campanhas de marketing turístico e a captação de grandes eventos”.

“Isso vai reverberar na fuga de investimentos na área hoteleira e de possíveis empreendedores e operadores de turismo que passam a evitar o investimento na região”, declara Márcia Margarida Martins.

Ponto de encontro entre baianos e turistas, o Largo de Santana amanheceu pichado com as iniciais do Comando Vermelho em abril deste ano. Mas não foi só isso. Momentos antes de as inscrições terem sido notadas, um homicídio foi registrado no local – um homem foi morto a golpes de garrafa na cabeça e pescoço.

Para a especialista em segurança pública, “temos o impacto cultural, pois os espaços que antes eram conhecidos por manifestações culturais podem ser esvaziados ou transformados em ‘áreas de risco’, afetando o patrimônio imaterial da cidade”. A Lagoa do Abaeté encaixa-se perfeitamente neste contexto. Nos tempos áureos, quando turistas chegavam ao bairro de Itapuã para ver as águas escuras cantadas por Dorival Cammy, isso há quase 20 anos, o local estava no roteiro das agências de viagens, mas o descaso, aliado a expansão das facções, deixaram só as lembranças, pois a debandada dos turistas e os registros de crime estigmatizaram a lagoa, prejudicando as vendas. “Os bares andavam lotados. Cheguei a empregar 20 garçons, mas tive que fechar”, explica o aposentado Álvaro Santana.

Liderança do BDM morrem em confronto com a PM em Castelo Branco por Redes sociais

Posicionamento

Ainda segundo a professora de Direito Penal e Processual e de Movimentos Sociais da Universidade Estado da Bahia (Uneb), Márcia Margarida Martins, o problema “exige polícia, políticas sociais e revitalização urbana. “Só a repressão não resolve; é preciso ocupar os espaços com cultura, economia e comunidade ativa, para que a presença das facções perca força e os turistas se sintam seguros”, declara.

O CORREIO pediu um posicionamento à Secretaria do Turismo do Estado da Bahia (SETUR). A pasta informou que o secretário estava em uma agenda no interior "e, geralmente, não comenta questões de segurança, que ficam com a Secretaria de Segurança Pública (SSP)". A reportagem pediu procurou a SSP, Polícia Civil (PC) e Polícia Militar (PM). Até o momento, não há respostas.